“Num
sistema de separação de poderes cabe também aos juízes garantir o Estado de
Direito e a legitimidade democrática. Mas só agora, consumado o golpe e para
encerrar a Operação Lava Jato, ouve-se ministro do STF dizer que proposta da
‘República de Curitiba’ é coisa de cretino. Antes juízes posavam de toga em
homenagem a Sergio Moro. É golpe quando a vontade popular é desrespeitada”.
A Odisseia de Homero narra que, diante dos pretendentes à
mão de Helena, a mulher mais bonita que o mundo conhecera, seu pai temia que a
escolha pudesse resultar numa guerra entre eles. Ulisses sugeriu que todos
jurassem respeitar a vontade que fosse manifestada e ao escolhido não causassem
qualquer mal. Assim, Helena pôde casar com Menelau. A escolha foi respeitada. A
Guerra de Troia se desencadeou porque Helena, depois de casada, fugiu de
Esparta com Páris.
Numa festa, Éris, deusa da discórdia, jogou uma maçã de ouro
entre as deusas, onde se lia “à mais bela”. Provocou-se uma disputa entre Hera,
Atena e Afrodite. Zeus nomeou Páris para ser o juiz da disputa, porque era
honesto, mas as deusas tentaram corrompê-lo. Hera lhe prometeu o poder sobre o
mundo, e Atena, vitórias militares e honrarias. Afrodite lhe prometeu o amor de
Helena.
Juízes honestos não são apenas os que não recebem vantagens
materiais indevidas. Mas também os imparciais, os que não tiram proveitos
indevidos do cargo e os que obedecem ao ordenamento jurídico, que lhes confere
poder, e atuam de acordo com a consciência. Páris não se corrompeu por bens
materiais, nem por glórias, mas pelo amor de Helena.
O processo de impeachment da presidente Dilma evoca o princípio
de que a democracia somente épossível se todas as forças envolvidas nas
disputas aceitarem respeitar a vontade que for manifestada e ao escolhido não
causar qualquer mal. As tentativas de golpe no presidente Lula não encontraram
o mesmo eco que com a presidente Dilma, menos suscetível às barganhas com um
Parlamento corrompido. As forças que disputaram as eleições de 2014 não lhe
reconheceram a vitória e tentaram o golpe até instalar o processo de
impeachment, sem imputação de crime. Para tanto, corromperam o vice-presidente.
O comando do país pelos golpistas derrotados eleitoralmente em 2014 demonstra o
desprezo pelo resultado das eleições.
Num sistema de separação de poderes cabe também aos juízes
garantir o Estado de Direito e a legitimidade democrática. Mas só agora,
consumado o golpe e para encerrar a Operação Lava Jato, ouve-se ministro do STF
dizer que proposta da ‘República de Curitiba’ é coisa de cretino. Antes juízes
posavam de toga em homenagem a Sergio Moro. É golpe quando a vontade popular é
desrespeitada.
Publicado originariamente
no jornal O DIA, em 27/08/2016, pag. 12. Link: http://odia.ig.com.br/noticia/opiniao/2016-08-27/joao-batista-damasceno-porque-e-golpe.html
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