segunda-feira, 29 de agosto de 2016

Um ministro trapalhão


 “Conheço o ministro. Por indicação do DEM e do senador Renan Calheiros, foi conselheiro do CNJ em sua primeira composição, em 2005. Em Brasília, para tratar de questão coletiva da magistratura, pedi a ele audiência. Ele apenas solicitou que eu o aguardasse. A hora passou, e ele tinha saído por outra porta e ido embora. Relatei o fato a um amigo, que se indignou e disse que sabia quem mandava nele e que ele teria que me receber. Meu amigo telefonou para o dono do conselheiro, que telefonou para ele, que abaixou o topete imaginário e humildemente me recebeu. O constrangimento era recíproco. Fui à audiência para lhe mostrar que sabia quem mandava nele e que independência funcional somente a tem quem ocupa o cargo por mérito, e não por politicagem e espetacularizações de quem coloca o carreirismo acima de valores e princípios”.

Plagiando o ministro José Eduardo Cardozo, que implementou repressão aos movimentos sociais e conseguiu, em 12/07/2014, a prisão de estudantes no Rio para não se manifestarem no final da Copa do Mundo, o ministro Alexandre de Moraes — criminalizando condutas antecipadamente — conseguiu a prisão de jovens que desabafavam pela internet suas frustrações. Irresponsavelmente, o ministro disse tratar-se de uma organização terrorista vinculada ao Estado Islâmico capaz de atos de terrorismo durante a Olimpíada.

Com estética capilar semelhante à de Mussolini, o ministro tem história, a começar pelo tangenciamento à máfia da merenda. Na ópera-bufa encenada, não faltaram fantasias pueris. Em entrevista, disse ter rastreado conversas pelo WhatsApp, apesar de serem criptografadas de ponta a ponta e de impossível interceptação. Apelidos dos presos podem ter confundido jovens de periferia com árabes criminalizáveis pelo racismo: Orelha, Trek do Amor, Pão com Ovo, Pixote, Sapinho, Leitão, Bamba e Chapoca, dentre outros.

O juiz abdicou do papel de garantista da liberdade. Prendeu por antecipação ao crime, mas para investigação. E descartou se tratar de terroristas. O ministro insistiu, chamou a imprensa e divulgou a fantasia da insegurança com a qual se justificam as truculências do Estado Policial. O resultado foram milhares de cancelamentos de viagens e hospedagens de turistas traumatizados com terrorismo em lugares onde ele realmente existe.

Conheço o ministro. Por indicação do DEM e do senador Renan Calheiros, foi conselheiro do CNJ em sua primeira composição, em 2005. Em Brasília, para tratar de questão coletiva da magistratura, pedi a ele audiência. Ele apenas solicitou que eu o aguardasse. A hora passou, e ele tinha saído por outra porta e ido embora. Relatei o fato a um amigo, que se indignou e disse que sabia quem mandava nele e que ele teria que me receber. Meu amigo telefonou para o dono do conselheiro, que telefonou para ele, que abaixou o topete imaginário e humildemente me recebeu. O constrangimento era recíproco. Fui à audiência para lhe mostrar que sabia quem mandava nele e que independência funcional somente a tem quem ocupa o cargo por mérito, e não por politicagem e espetacularizações de quem coloca o carreirismo acima de valores e princípios.


Publicado originariamente no jornal O DIA em 30/07/2016, pag. 16. Link: http://odia.ig.com.br/noticia/opiniao/2016-07-30/joao-batista-damasceno-um-ministro-trapalhao.html

 

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