“Prisões para
evitar manifestações é o apogeu do Estado Policial. Mas o liberticídio não é
coisa de reles chefes das polícias estaduais; é parte de uma política federal
de repressão aos movimentos sociais em todo o país e se intensificou após
reunião de secretários de segurança no Ministério da Justiça. O governo federal
tem atuado na esfera reservada pela Constituição aos estados, e os governantes
locais aproveitam a oportunidade para exercitar seus desejos mórbidos, pondo
suas polícias contra a sociedade, tal como no tempo do Dops. O emprego das
Forças Armadas como polícia é emblemático. Setores do próprio Judiciário
funcionam nestes episódios como força subalterna, abdicando indevidamente do
papel de garantidores dos direitos.”
O ministro da Justiça se manifestou
sobre prisões de pessoas previamente à prática de ilícitos e expressou não
haver ilegalidade, pois atendidos os requisitos formais. Tal pensamento é
similar ao dos gorilas que sequestraram as liberdades em 1964, período no qual
— atendidos os requisitos formais — não se permitia analisar a substância dos
atos, sobretudo durante a vigência do AI-5. Por vezes, formalidades davam
roupagem de aparente legalidade à prisão, mesmo ante a falta de fundamento que
lhe desse legitimidade.
Os gorilas violaram a Constituição
sob o fundamento de que o poder revolucionário, que se atribuíam, era
constituinte. Em 1969 editaram a Emenda Constitucional 1. Outorgaram uma
Constituição, mas, do ponto de vista formal, era só uma emenda.
Prisões para evitar manifestações é o
apogeu do Estado Policial. Mas o liberticídio não é coisa de reles chefes das
polícias estaduais; é parte de uma política federal de repressão aos movimentos
sociais em todo o país e se intensificou após reunião de secretários de
segurança no Ministério da Justiça. O governo federal tem atuado na esfera
reservada pela Constituição aos estados, e os governantes locais aproveitam a
oportunidade para exercitar seus desejos mórbidos, pondo suas polícias contra a
sociedade, tal como no tempo do Dops. O emprego das Forças Armadas como polícia
é emblemático. Setores do próprio Judiciário funcionam nestes episódios como
força subalterna, abdicando indevidamente do papel de garantidores dos
direitos.
Movimentos sociais têm sido cooptados
e seduzidos por custeios e oportunidades de negócios ou severamente trucidados.
A presidenta Dilma Rousseff, em entrevista na Globo News, após o jogo do Brasil
com a Holanda, falou da “política federativa de segurança” e do “padrão de
segurança na Copa”. Mas não se implementou política de investigação dos
homicídios de trabalhadores, de jovens e de negros nas periferias, nem das
violações reiteradas aos direitos humanos.
Um sistema que precisa prender
advogados e filósofos para se manter demonstra falta de razão para convencer
dos fundamentos que o legitima. Mais do que uma demonstração ao capital
financeiro internacional de que o Brasil é um país seguro para suas
especulações, a política repressiva visa a afastar a pretensão popular de
participação na vida pública.
Benedito Valares, velho político
mineiro, dizia gostar do povo visto do palanque, pois lá estava para
aplaudi-lo. Anastácio Somoza, ditador nicaraguense derrubado pela Revolução
Sandinista em 1979, dividia o povo em três categorias: os amigos, a quem dava
ouro; os indiferentes, a quem dava prata, e os inimigos, a quem destinava
chumbo. No Brasil, quem ficou com o ouro foi a Fifa. Aos que não se
domesticaram para receber a prata restaram chumbo, remoções, repressão brutal e
prisões.
Publicado
originariamente no jornal O DIA, em 20/07/2014. Link: http://odia.ig.com.br/noticia/opiniao/2014-07-19/joao-batista-damasceno-liberticidio-de-brasilia.html
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