Desde 2007 se realiza, anualmente, no Brasil, a Marcha da Maconha propondo a regulamentação das drogas que são vendidas em larga escala em todo o país, apesar do proibicionismo. Inicialmente os manifestantes da marcha enfrentaram resistência, pois o Ministério Público a considerava apologia ao uso de drogas e tentava impedir, na Justiça, a manifestação.
E, lamentavelmente encontrava juízes que lhe dava ouvidos. Em 2011, o STF decidiu que debater e propor a legalização das drogas não se confunde com apologia ao seu uso. Por falta de proposta a ser apresentada à sociedade, alguns candidatos adotam pautas moralistas e alguns insistem na confusão entre a proposta de legalização com a apologia. Trata-se do mesmo pessoal que é contra a vacina, pois a seringa usada pode também servir para outros fins, inclusive uso de drogas injetáveis. Vá entender!
Na Marcha comparecem pessoas de diversas correntes
de opinião na defesa da legalização da produção, comércio e consumo, que o
Estado finge poder controlar exclusivamente por meio de seu aparato repressivo.
Os que as usam e os que lucram com o comércio ilegal não têm razões para
defender a regulamentação. Ao contrário. Os que usam já têm fornecimento
garantido e os que lucram com o proibicionismo não querem a concorrência da
legalidade, nem controle sobre o que comerciam. Mas os que não usam ou não
lucram com o proibicionismo e são contra o tráfico têm razões sérias para
pretenderem a regulamentação.
É o proibicionismo e a guerra às drogas que geram a
violência contra crianças, idosos, trabalhadores e outras pessoas que jamais
tiveram contato com drogas ilícitas, que pavimentam o caminho para a corrupção
e que matam policiais mandados irresponsavelmente para o confronto. Morre-se e
mata-se em razão da proibição em número assustador, quando os casos de morte
por overdose são raros. A vida e a Saúde pública não são defendidas com o
proibicionismo, pois apenas serve para justificar o aparato repressivo, o lucro
dos agentes públicos corrompidos pelo tráfico e o controle da sociedade.
A Lei Seca nos Estados Unidos incentivou o
desenvolvimento da máfia, da qual Al Capone foi o ícone. Regulamentado o
comércio de bebida alcoólica, a máfia estadunidense teve que buscar novos
negócios. Pessoas que cultivavam videiras e proprietários de pequenos
alambiques clandestinos puderam produzir para consumo familiar sem necessidade
de se armar ante o risco da violência para roubo do produto proibido.
Por se tratar de ano eleitoral, na internet já
circulam vídeos de pessoas que não se apresentam como candidatas, mas aparentam
esta qualidade, criticando a regulamentação. Suponho se tratar de pessoas sem
efetiva preocupação com os efeitos danosos do proibicionismo. Em um dos
discursos demagógicos diz-se da necessidade de tolerância zero com usuários de
drogas, porque por falta de dinheiro cometeriam pequenos furtos para
adquiri-las. O problema para quem faz tal discurso não é a droga. Mas a pobreza
e a miséria. Em suas visões os usuários que tenham recursos para a aquisição
não devem ser incomodados.
Este tipo de discurso vazio, apresentado como
defesa de valores éticos reais, acaba por esconder as efetivas relações de tais
oradores, notadamente quando já testados em cargos nos quais poderiam ter
ajudado na segurança dos direitos. Em casos concretos nos quais seus auxiliares
foram flagrados com vultosos valores monetários, em espécie, que não se
comparam com furtos de pequena monta, ficaram calados.
Desde o ano da primeira Marcha da Maconha, 2007,
tenho tido intensa interlocução com policiais, promotores, magistrados,
professores e outros profissionais que estudam os efeitos danosos do
proibicionismo, dentre os quais os membros da associação dos Policiais
Antifascismo, que teve como um dos fundadores o delegado fluminense Orlando
Zaccone. Em audiência pública no Senado Federal em 2014, tive a oportunidade de
deixar nos anais daquela casa a opinião de que a regulamentação não significa
liberação, nem favorecimento do consumo.
É necessária a eliminação da política de proibição
das drogas e a introdução de uma política alternativa de controle e regulação,
com medidas restritivas à venda e ao uso em razão da idade, da mesma forma das
restrições para aquisição ou consumo de álcool, de tabaco, para direção de
veículos e operação de equipamentos pesados.
Uma criança ou adolescente pode ter dificuldade em
comprar bebida alcoólica ou cigarro na maioria dos estabelecimentos comerciais
do país, pois é regulamentado, mas nada a impede de adquirir o tipo de droga
ilícita que quiser. Somente os que lucram com o comércio ilegal têm razões
justificáveis, por seus interesses, para a manutenção do proibicionismo e a
guerra às drogas. Policiais brutalizados ou corruptos e traficantes não desejam
regulamentação e controle das drogas. Policiais que apoiam a regulamentação são
de novo tipo: humanizados.
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