“É com a
garantia dos direitos daqueles com quem não nos afeiçoamos que colocamos a
prova nossa fidelidade aos valores com os quais dizemos ser comprometidos. Que
todos tenham os seus direitos assegurados. Até mesmo Eduardo Cunha. E que a
justiça se faça e imponha responsabilidades sem se confundir com vingança”.
Parcela da
sociedade comemorou a prisão do ex-deputado Eduardo Cunha sem perceber que a
violação de seus direitos é a exceção, à direita, necessária para violarem os
direitos de qualquer um.
Dispõe a
Constituição que ninguém será preso se por outro modo puder ser
responsabilizado criminalmente e que ninguém será considerado culpado até o
trânsito em julgado de sentença penal condenatória, ainda que o próprio STF
esteja negando o texto constitucional.
O juiz Sérgio
Moro justificou a prisão de Eduardo Cunha com argumentação genérica, tal como
abusivamente se faz todo dia no Brasil. O STF, que interveio no funcionamento
parlamentar e afastou Cunha do exercício de seu mandato, já havia negado o
pedido de prisão sob o fundamento de que outras medidas acautelatórias poderiam
ser impostas e que a prisão era desnecessária.
A violação dos
direitos do pior dos fascínoras é a porta aberta para violação dos direitos de
toda a sociedade. É com a tácita autorização para se matar jovens negros na
periferia que agentes do estado matam qualquer um, bastando-lhes posteriormente
dizer que se tratava de traficante.
Quando Lula foi
indevidamente conduzido coercitivamente, sem prévia intimação, a comentariasta
televisa Cristiana Lobo dizia que não havia arbitrariedade porque era a 147ª
condução ordenada por Moro. As 146 violações anteriores serviram para
justificar a arbitrariedade cometida contra Lula. O que muitos não vêem é que
Cunha, assim como o foi Severino Cavalcanti, é baixo clero; é pessoa com
visibilidade, mas não é componente da estrutura real de poder no Brasil. Duvido
que José Sarney, Romero Jucá, Renan Calheiros, José Serra, Tasso Jereissati,
Aécio Neves, Michel Temer ou Fernando Henrique Cardoso venham a ser molestados.
É fácil processar e julgar membros de setores populares, ainda que alçados a
visibilidade, ou gente do baixo clero que cai em desgraça e passa a ter o valor
de um cachorro morto na beira da estrada como é Eduardo Cunha.
É com a
garantia dos direitos daqueles com quem não nos afeiçoamos que colocamos a
prova nossa fidelidade aos valores com os quais dizemos ser comprometidos. Que
todos tenham os seus direitos assegurados. Até mesmo Eduardo Cunha. E que a
justiça se faça e imponha responsabilidades sem se confundir com vingança.
Publicado originariamente no
jornal O DIA, em 22/10/2016, pag. 11.
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