domingo, 8 de junho de 2014

Cheiro de pólvora no ar

“No dia 13 de junho eclodiu a primeira grande manifestação no Rio de Janeiro, que inicialmente questionava o aumento das tarifas de transporte público sem planilha de custo que o justificasse. Seguiram-se outras manifestações, dentre as quais, a de 20 de junho onde mais de 1 milhão de pessoas foram às ruas. A princípio autoridades e instituições estatais ficaram aturdidas. Mas, logo se recompuseram, articularam-se contra o povo, promoveram repressão violenta, prisão em massa e criminalização até de advogados que defendiam a liberdade. A sociedade, que soube se manifestar contra a falta de políticas públicas adequadas, tem o poder de realizar seus desejos sem passos atrás em sua caminhada.”

Artigo publicado neste espaço no dia 04 de junho de 2013, intitulado ‘Brasil x Itália’ afirmava que a Constituição determina deva a ordem econômica assegurar a existência digna conforme os ditames da justiça social. E indagava: Mas, o que é uma Constituição diante da primazia do capital? O desrespeito ao Estado de Direito em nome de um campeonato mundial de futebol já estava evidente. As instituições já estavam postas a serviço dos cartolas.

O artigo lembrava que reações vivenciadas em outros lugares do mundo onde governantes se envolveram em práticas similares e exemplificava com ocorrência em março de 2011, na Itália, quando se comemorava 150 anos de sua unificação, e na Ópera de Roma executava-se ‘Nabuco’, de Verdi. Ao findar o ‘Va Pensiero’, canto dos escravos oprimidos, que naquele país evoca o grito de liberdade do povo, o silêncio da platéia substituíra-se por fervor. O maestro Riccardo Muti dissera sentir a reação do público enquanto o coro dos escravos cantava: ‘Ó, pátria minha, tão bela e ultrajada’. A platéia gritava “Bis!” e “Viva a Itália!” O constrangimento do primeiro-ministro Silvio Berlusconi não poderia ter sido maior. O maestro não queria fazer o bis para o ‘Va Pensiero’, pois uma ópera não deve sofrer interrupções. Mas rendeu-se e disse: “Sim, estou de acordo. Viva a Itália! Se é o que querem, cantemos juntos!”. Ao final, público, músicos, atores e maestro choravam de emoção, demonstrando a vitalidade da sociedade italiana diante da truculência e desmandos do Estado.

O artigo citava ‘O Príncipe’, onde Maquiavel, em 1513, escrevera que a virtude se empunharia contra a fúria porque o valor não se apagara dos corações italianos.  E, concluía dizendo que também a brasilidade não se apagara do coração do povo brasileiro que haveria de reagir aos governantes e à truculência de sua polícia a serviço dos cartolas, da Fifa e dos empreiteiros. Havia cheiro de pólvora no ar. As manifestações dos indígenas em todo o país foram apontadas como o começo da reação ao que se fazia com o povo.

No dia 13 de junho eclodiu a primeira grande manifestação no Rio de Janeiro, que inicialmente questionava o aumento das tarifas de transporte público sem planilha de custo que o justificasse. Seguiram-se outras manifestações, dentre as quais, a de 20 de junho onde mais de 1 milhão de pessoas foram às ruas. A princípio autoridades e instituições estatais ficaram aturdidas. Mas, logo se recompuseram, articularam-se contra o povo, promoveram repressão violenta, prisão em massa e criminalização até de advogados que defendiam a liberdade. A sociedade, que soube se manifestar contra a falta de políticas públicas adequadas, tem o poder de realizar seus desejos sem passos atrás em sua caminhada.



Publicado originariamente no jornal O DIA em 01/06/2014, pag. 16.

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