“As recentes
perseguições promovidas pela polícia do estado, à margem da Constituição,
contra meninos pobres e negros da periferia, é a resposta ao medo que se
cultivou em condições para que seja mantido. Não são ocorrências concretas de
crimes que deixam a classe média em pânico, mas a estética, a música, a
magreza, o comportamento social e a origem dos discriminados. Poucos são os
casos concretos de furtos, mas expostos reiteradamente por uma mídia aliada da
repressão parecem milhões”.
A Revolta de São Domingos pôs fim à
escravidão e proclamou a independência do Haiti, colônia francesa, e o tornou a
primeira república governada por originários da África. A Revolução Haitiana,
de 1791, se realizou no contexto da Revolução Francesa de 1789. Mas, enquanto a
violência da revolução da burguesia na França foi saudada como marco da
liberdade, a violência da Haitiana, promovida por escravos em busca da
liberdade, foi registrada como massacre bárbaro e deixou receosas as classes
dominantes nos países que exploravam mão de obra escravizada.
Nem a Conjuração Mineira de 1789
incluía em seu ideário a abolição da escravatura, e o medo alastrou-se pelo
Brasil, intensificando-se com a descoberta de textos em árabe, em 1840, na
Bahia. Não havendo quem os traduzisse, imaginou-se tratar-se de uma revolução
dos negros islâmicos, e o fato ficou conhecido como Revolta dos Malês. O medo
do desejo alheio de liberdade nos animou no século 19 quando o Rio tinha três
escravos para cada habitante livre.
A classe dominante cultivou a
exclusão e conviveu com o medo do que criava, a ponto da perseguição à Guarda
Negra da Princesa Isabel e da criminalização da capoeira no Código Penal da
República. Na República, pela primeira vez, tivemos um coronel do Exército comandando
a polícia no Rio, a exemplo do delegado federal que hoje chefia a Secretaria de
Segurança.
As recentes perseguições promovidas
pela polícia do estado, à margem da Constituição, contra meninos pobres e
negros da periferia, é a resposta ao medo que se cultivou em condições para que
seja mantido. Não são ocorrências concretas de crimes que deixam a classe média
em pânico, mas a estética, a música, a magreza, o comportamento social e a
origem dos discriminados. Poucos são os casos concretos de furtos, mas expostos
reiteradamente por uma mídia aliada da repressão parecem milhões.
Se os governantes, quando vão a Paris
para festas com lenços na cabeça, andassem de metrô, ouviriam dos alto-falantes
alertas de cuidado com carteiras e celulares. Mas, tal como aqui, deslocam-se
em carrões e helicópteros de custeio discutível, desconhecem o mundo no qual
vivem, ignoram o Estado de Direito e desafiam até decisões judiciais.
Publicado originariamente
no jornal O DIA, em 27/09/2015, pag. 18. Link: http://www.clipnaweb.com.br/tjrj/Imagens/2015%5C09%5C27%5C0000128055.pdf
Nenhum comentário:
Postar um comentário