A economia brasileira tem se fundado na exportação de
commodities, ou seja, matéria-prima produzida em larga escala, negociada
mundialmente, em estado bruto ou pouco industrializada e estocável em grande
quantidade. São matérias-primas básicas, não processadas industrialmente,
servindo para a produção de produtos mais complexos e de maior valor agregado.
O que agrega valor à matéria prima é o trabalho humano. Se exportamos matéria
prima, possibilitamos a criação de empregos nos países destinatários e deixamos
de criar em nosso país.
Ao longo de sua história a economia brasileira esteve voltada
para suprir as potências mundiais de matérias primas. Nosso gentílico,
qualidade pela qual somos conhecidos, decorre da atividade dos exploradores de
pau brasil que o levavam para a Holanda, onde era triturado para produzir
tinta. Brasileiro é a profissão de quem extraía, transportava ou vendia pau
brasil. Deveríamos ser brasilienses ou brasilianos. O sufixo eiro designa
profissão e não local de nascimento: carpinteiro, pedreiro, açougueiro, verdureiro,
cozinheiro etc. Fomos designados pela atividade econômica originária e não pelo
local no qual nascemos.
Depois do pau brasil veio o ciclo da cana, produzindo-se
açúcar para adoçar a vida dos europeus, em seguida a descoberta do ouro nas
minas do interior do Brasil deu origem aos mineiros, e depois veio o ciclo do
café. Hoje exportamos soja, café em grão, carne bovina e minério de ferro em
estado bruto. A exportação de commodities não favorece o desenvolvimento.
Getúlio Vargas buscou a industrialização do Brasil criando a
estrutura básica para o desenvolvimento autônomo, tentando retirá-lo da
periferia do sistema internacional, porque dependente dos países centrais do
capitalismo estaremos consagrados à subordinação. Vargas criou a base
industrial: a Companhia Siderúrgica Nacional, a Petrobrás e deu o pontapé
inicial para a criação da Eletrobrás instalada em 1962 pelo Presidente João
Goulart. Mas adveio o Golpe Empresarial-militar de 1964 e o Brasil tomou novo rumo.
A redemocratização do Brasil e a Constituição de 1988 deram
esperanças de retomada de rumos. Mas a classe dominante brasileira, aliada ao
capital internacional, e os lacaios da burocracia estatal e da classe política
fisiológica desnaturaram a Constituição Cidadã e pouco resta do seu texto
original. Da sua edição em 05/10/1988 até 20/12/2024 foram 135 emendas
constitucionais, algumas de duvidosa constitucionalidade.
Tratando dos fundamentos da República, seus fundamentos e princípios
para a regência das relações internacionais previa a Constituição: a soberania;
a cidadania; a dignidade da pessoa humana; os valores sociais do trabalho; o
pluralismo político; a construção de uma sociedade livre, justa e solidária; a
garantia do desenvolvimento nacional; a erradicação da pobreza, da
marginalização e redução das desigualdades sociais e regionais; a promoção do
bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer
outras formas de discriminação; independência nacional; a prevalência dos
direitos humanos; a função social da propriedade; a defesa do consumidor; a
defesa do meio ambiente; a busca do pleno emprego, além da erradicação do
analfabetismo; a universalização do atendimento escolar; a melhoria da qualidade
do ensino; a formação para o trabalho e a promoção humanística, científica e
tecnológica do País.
O país democrático pensado por Ulisses Guimarães está em seu
discurso de promulgação da Constituição de 1988 quando disse que "Traidor
da Constituição é traidor da pátria. (...) Temos ódio à ditadura. Ódio e nojo.
(...) O Estado prendeu e exilou. A sociedade, com Teotônio Vilela, pela
anistia, libertou e repatriou. A sociedade foi Rubens Paiva, não os facínoras
que o mataram.”
Os rumos tomados pelo Brasil são diferentes dos pretendidos
pelos Constituintes e declarados no discurso de Ulysses Guimarães. As emendas
constitucionais são aprovadas sem consideração ao que previa o poder
constituinte originário. A Constituição diz que “Todo o poder emana do povo,
que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos
desta Constituição.” Quando o povo o exerce diretamente tal vontade se sobrepõe
à vontade dos seus representantes. O povo brasileiro decidiu, em plebiscito,
entre presidencialismo e parlamentarismo. E venceu o presidencialismo. Mas
navega a todo o vapor uma emenda constitucional para instituir o
semipresidencialismo no Brasil.
O objetivo de erradicar a miséria e a fome foi esquecido, salvo por políticas assistenciais. Os estoques reguladores que o Estado criava para ofertar produtos e baixar o preço quando por algum motivo os preços se elevassem, foram extintos. Rege o preço dos alimentos a neoliberal lei do mercado onde a redução da oferta, por qualquer motivo, força a alta dos preços ante a manutenção da procura. Afinal, comer é uma necessidade biológica. E não é de hoje. Sob a gerência do ministro neoliberal Paulo Guedes o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro extinguiu os estoques públicos e em 2022, último ano de seu governo, os alimentos aumentaram 11,64%, mais que o dobro da inflação oficial que foi de 5,79%. Mas não adianta praguejar o malfeito. É preciso fazer diferente, sob pena de perder-se a confiabilidade e tornar o país propenso à crença em boatos e fake News.
Publicado originariamente no jornal O DIA, em 08/02/2025,
pag. 12. Link: https://odia.ig.com.br/opiniao/2025/02/6999838-joao-batista-damasceno-o-preco-dos-alimentos-e-o-neoliberalismo.html
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