quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Arquitetura, arte e poder


“A profusão de prédios do Tribunal de Justiça do Rio — um deles de costas para a rodoviária onde está o povo —, a censura à obra ‘por uma cultura de paz’, do cartunista Carlos Latuff, e a escolha do pedreiro Amarildo para patrono da turma dos formandos em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal Fluminense demonstram que arte, arquitetura, Justiça e poder podem estar relacionados e expressar concepções ideológicas”.

Na direção da Escola de Artes Aplicadas de Weimar desde 1919, Walter Gropius a mudou para Dessau e fundou a Bauhaus, escola que concebeu obras funcionais e não meramente estéticas ou decorativas. Buscou integrar a arte e a técnica; o funcional e o estético. No mesmo período o arquiteto Alfred Agache foi contratado para remodelar a cidade do Rio e a concebeu neoclássica.

Trata-se do estilo do prédio da Assembleia Legislativa do Rio, inaugurado em 1926, e no qual por toda parte se vê o ‘fascio’, feixe de varas que expressa a unidade totalitária do fascismo italiano, servindo de cabo do martelo romano, símbolo do poder. Neoclássico foi o estilo adotado pelos Estados totalitários de direita. É, também, o estilo do prédio do Ministério da Fazenda no Rio. Agache foi o arquiteto da ditadura do Estado Novo de 1937 a 1945.

Na Alemanha, em 1933, os nazistas tomaram o poder e perseguiram a Bauhaus, que consideravam ‘arte comunista e degenerada’. Gropius se exilou nos EUA. Em 1931 Lúcio Costa se demitiu da direção da Escola de Belas Artes, por ter aderido ao modernismo. Mas Vargas também precisava de um estilo diferente que o do governo que derrubara. Em 1936 iniciou a construção do prédio do MEC, no Rio, marco da arquitetura moderna brasileira. Projetado pelos jovens arquitetos Lúcio Costa, Affonso Reidy, Oscar Niemeyer e outros, sob a consultoria do francês Le Corbusier, o prédio é realmente do público. Não tem escadarias, muros, grades, sentinelas ou guaritas. O cidadão que passa pela rua entra nele, sem perceber qualquer limite. Tudo é público: a rua e o prédio.

A profusão de prédios do Tribunal de Justiça do Rio — um deles de costas para a rodoviária onde está o povo —, a censura à obra ‘por uma cultura de paz’, do cartunista Carlos Latuff, e a escolha do pedreiro Amarildo para patrono da turma dos formandos em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal Fluminense demonstram que arte, arquitetura, Justiça e poder podem estar relacionados e expressar concepções ideológicas. 

 
Publicado originariamente no jornal O DIA, em 11/12/23013, pag. 20. Link: http://odia.ig.com.br/noticia/opiniao/2013-12-11/joao-batista-damasceno-arquitetura-arte-e-poder.html

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