terça-feira, 6 de dezembro de 2016

Estatística mascarada


“O homicídio contra o professor da UERJ Marcus Flávio do Amaral Vasconcellos, Pingo, foi registrado na Delegacia Policial como lesão corporal. O carro no qual viajava parou num sinal, no Méier, atrás de outro que estava sendo assaltado. Dois indivíduos que davam cobertura ao assalto devem ter acreditado que os professores eram policiais e disparavam contra o carro com tal intensidade que o seguro lhe deu perda total. O motorista foi atingido na testa de raspão e o professor Pingo levou um tiro na nuca. Hospitalizado, o professor permaneceu no CTI por 18 meses até falecer no domingo, dia da eleição. Mesmo que o professor tivesse sobrevivido o crime seria homicídio em sua modalidade tentada. Jamais lesão corporal, como se registram para mascarar estatísticas”.
 
O fracasso da política de segurança instituída no Rio de Janeiro chamada em 2007 de polícia de confronto pelo secretário Beltrame - e que intelectuais e artistas, naquela época, qualificaram em manifesto como política de extermínio – tem sido dolosamente mascarado pelos registros e estatísticas oficiais. Por isso o governo não liberou os dados para pesquisa sobre desaparecidos do projeto ‘Somos todos Amarildo’.
Na história da violência no Rio de Janeiro os agentes do Estado sempre estiveram um degrau acima. A militarização da polícia, sua cadeia de comando e o sistema de justiça que a protegeu elevou os patamares da violência urbana. Um criminoso encurralado pelos agentes do Estado não mais se rende, porque sabe: irá morrer. Por isso causa danos antes de ser exterminado. Já não existe a clássica expressão que valia tanto para policiais quanto para criminosos: “Perdi!”. Isto possibilitava ao policial desarmar o criminoso e prendê-lo ou a este liberar o policial para que, desarmado, partisse. A vida era preservada. A política de segurança do Estado é matar ou morrer. Mas, dentre os policiais somente morrem os praças; nenhum oficial em serviço.
O homicídio contra o professor da UERJ Marcus Flávio do Amaral Vasconcellos, Pingo, foi registrado na Delegacia Policial como lesão corporal. O carro no qual viajava parou num sinal, no Méier, atrás de outro que estava sendo assaltado. Dois indivíduos que davam cobertura ao assalto devem ter acreditado que os professores eram policiais e disparavam contra o carro com tal intensidade que o seguro lhe deu perda total. O motorista foi atingido na testa de raspão e o professor Pingo levou um tiro na nuca. Hospitalizado, o professor permaneceu no CTI por 18 meses até falecer no domingo, dia da eleição. Mesmo que o professor tivesse sobrevivido o crime seria homicídio em sua modalidade tentada. Jamais lesão corporal, como se registram para mascarar estatísticas.
Está chegando ao fim a gestão do secretário Beltrame. Felizmente! Mas, seu legado será lamentável. O que nos resta é romper com tal legado e instituirmos outra política de segurança que possibilite a humanização das relações sociais, a valorização da vida dos que morrem – policiais e população - nos confrontos, o enfraquecimento das milícias e apropriação pública pelo que é público.
 

Publicado originariamente no jornal O DIA, em 08/10/2016, pag. 11.

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