sábado, 16 de fevereiro de 2019

A boa polícia

A incursão da PM no Morro do Fallet causou 15 mortes. Há dúvida se houve efetivo confronto e exercício de legítima defesa. Mães e vizinhos não negam que alguns dos mortos empreendiam comércio varejista de drogas. Mas, falam em torturas antes das execuções, bem como morte por faca. Causa estranheza um confronto com 15 mortos e nenhum policial sequer ferido. Os precedentes da polícia em diversas outras ocorrências é o fundamento da dúvida.

Mas não foi o BOPE. Justiça seja feita. Foi o BPChq, comandado pelo tenente-coronel André Batista.Depois de comandar o 9° BPM de Rocha Miranda, o tenente-coronel Batista assumiu o comando doBPChq. Trata-se de policial da elite da tropa, com curriculum premiado. Ele foi o negociador do sequestro do ônibus 174, onde morreram a professora Geiza Gonçalves e o assaltante Sandro Barbosa. Além disto, é co-autor do livro Elite da Tropa em parceria com Rodrigo Pimentel e o sociólogo Luiz Eduardo Soares. O personagem André Matias no filme Tropa de Elite, teria sido inspirado nele. Foi um dos assessores do sociólogo, em secretaria municipal de Nova Iguaçu, na gestão do então prefeito Lindberg Farias.


Mas, a polícia não deve ser sozinha responsabilizada por suas violências. Os que pensam para ela e lhes formulam as justificações são igualmente responsáveis. A polícia violenta, mas incorruptível, retratada no filme Tropa de Elite 1, decorre de uma concepção da “boa polícia” da qual falam o sociólogo Luiz Eduardo Soares da Universidade do Estado do Rio de Janeiro/UERJ e o antropólogo Roberto Kant de Lima da Universidade Federal Fluminense/UFF, onde criou curso de Segurança Pública. Em suas formulações, a “boa polícia” há de ser incorruptível, mas pode ser violenta. Em suas opiniões, corrupção é uma opção; é um desvio pessoal. Mas, a violência é um desígnio inevitável da atuação policial


Não se pode negar o direito à legítima defesa. É a defesa da própria vida em detrimento da vida ou incolumidade física de um agressor injusto. Mas, não se pode incentivar a escalada da violência. O Estado brasileiro já sofreu condenações da Corte Interamericana de Direitos Humanos por suas violações em chacinas. As condenações na CIDH não têm surtido efeito. Ela julga Estados. Igualmente não têm sido eficazes os mecanismos nacionais de controle da violência do Estado. Resta apelar para o Tribunal Penal Internacional. O TPI julga indivíduos por crimes de genocídio, de guerra, contra a humanidade e crimes de agressão. Se é guerra, que sejam os autores e partícipes submetidos à Convenção de Genebra. Se não, e não é, sejam julgados por eventuais crimes contra a humanidade, assim considerados os massacres, a desumanização, os extermínios e as execuções. Em tal caso, tanto pode responder os que executam, quanto toda a cadeia de comando que de qualquer forma concorre para os crimes, inclusive quem incentiva execuções ou faz apologia propondo snipers para “mirar nas cabecinhas”.



Publicado originariamente no jornal O DIA, em 16/02/2019, pag. 10.

2 comentários:

  1. Não podemos ser coniventes com chacinas das populações periféricas indefesas. Que se faça justiça, palavra tão vilipendiado no Brasil contemporâneo. BASTA!

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