Viver eticamente implica fazer escolhas e
conviver com o resultado. Isto exige uma postura lógica diante da vida com a
compreensão de que tudo tem consequência. Muito do que suportamos pode
decorrer, exclusivamente, da conduta de terceiros ou mesmo da natureza. Mas há
o que depende de nossas escolhas. A debilidade intelectual é um fator que
impede a compreensão da relação de causalidade entre uma conduta e seu efeito
danoso. Mas, também é responsável pela irresponsabilidade a concepção mágica da
vida, que atribui às divindades o que nos acontece.
Há quem conceba sermos fantoches nas mãos de
divindades e que tudo decorre da ira ou da generosidade de seres divinos. O
pensamento mágico tem como contraposição a racionalidade inaugurada no século
XV e da qual decorreu o Renascimento das artes e a Revolução Industrial. Mas,
tal modo de pensar não chegou ao nosso cotidiano.
Vivemos um momento de crise. O Brasil tem
cerca de 15 milhões de desempregados. Os direitos dos trabalhadores estão sendo
sucateados. A própria Justiça do Trabalho está sendo vilipendiada. O mundo do
trabalho está sendo precarizado. A pretexto da luta contra a corrupção,
grandes empresas brasileiras, que traziam divisas para o país, foram levadas à
falência. As riquezas nacionais estão sendo entregues às corporações internacionais,
em prejuízo do povo brasileiro cuja miserabilidade aumenta e já está
explicitada nos indicadores sociais.
Neste cenário macabro, um dos protagonistas
da destruição surge como beneficiário do caos que ajudou a provocar, sem que se
estabeleçam relação entre suas condutas e as consequências. O ex-juiz
Sergio Moro foi contratado pela empresa de consultoria estadunidense Alvarez
& Marsal, na função de sócio-diretor para a área de Disputas e
Investigações. Entre os principais clientes da empresa, está a Odebrecht, uma
das construtoras mais afetadas pela Operação Lava Jato.
Moro era o juiz responsável por julgar as
denuncias contra a companhia e prender seus diretores como condição para que
uns depusessem contra outros. Sua contratação evidencia conflito de interesses.
Mas, aparentemente, tal como no reino da amoralidade, o ex-juiz não vê problema
em se levar uma empresa à falência e posteriormente se tornar sócio da
administração da massa falida.
Lawfare é expressão que designa o uso do
Direito como arma de guerra. No caso, não é exagero dizer que o ex-juiz Sergio
Moro age como um soldado que tira proveito dos despojos de guerra. Numa guerra
o vencedor se sente no direito de se apropriar dos bens do vencido. É o butim.
Mas, a lógica da guerra é diversa da lógica da Justiça e um juiz não pode
ter proveito da causa que julga. E por isso, a imparcialidade é um requisito
para o exercício da magistratura. Juízes não podem ser amorais, a ponto de não
conceberem limites para suas atuações. Mas, não sendo deuses, nem demônios, são
capazes das mesmas condutas dos que condenam se inexistirem regras claras e
eficazes órgãos de controle.
Se a Constituição, desde 2004, veda aos
magistrados exercer a advocacia no juízo ou tribunal do qual se afastou, antes
de decorridos três anos do afastamento do cargo por aposentadoria ou
exoneração, não é preciso norma legal para vedar que um juiz seja contratado
por empresa cujas dificuldades decorram de seus julgamentos. A
incompatibilidade, evidenciada pelo conflito de interesses, decorre da
eticidade do próprio sistema jurídico. Mas, agora, quem tem o poder disciplinar
é a OAB, onde o ex-juiz tem sua inscrição profissional como advogado.
Publicado originariamente no jornal O DIA, em
05/12/2020. Link: https://odia.ig.com.br/opiniao/2020/12/6040569-joao-batista-damasceno-sergio-moro-uma-pessoal-amoral.html
Muito bem lembrado o Renascimento e o despertar da consciência critica, com a Ciência, a Filosofia as Artes. Mas que dizer de um povo que não tem acesso à Educação, não sabe o que é Ética nem sabe interpretar o que lê, quando sabe ler! Se até Paulo Freire desrespeitaram! Cabe a nós, que ainda temos voz, continuar esse trabalho de denúncia, resistencia, mostrando toda indignação que pudermos.
ResponderExcluirMuito bem lembrado o Renascimento e o despertar da consciência critica, prezado Damasceno, com a Ciência, a Filosofia, as Artes. Mas que dizer de um povo que não tem acesso à Educação, não sabe o que é Ética nem sabe interpretar o que lê, quando sabe ler! Se até Paulo Freire desrespeitaram! Cabe a nós, que ainda temos voz, continuar esse trabalho de denúncia, resistência, mostrando toda indignação que pudermos. Reverter esse quadro é nosso melhor sonho!
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