Hoje a partir das 11h, a
Universidade Livre do Leme promoverá mais uma aula do programa Filosofia na
Praia. Será no Quiosque Maria Alice, na Orla de Copacabana, quase em frente à
Rua Princesa Isabel. O professor Alexandre Leitão fará uma exposição intitulada
“Amigos, Romanos, Patrícios: Shakespeare, opinião pública e a peça ‘Júlio
César’”. Esta peça de Shakespeare é extraordinária. Após o atentado a Júlio
César, Marco Antônio foi para a escadaria do Senado e fez um discurso para a plebe,
revoltada com o assassinato.
Sem maldizer os assassinos,
Marco Antônio explicou as razões de cada um. O povo se quietou para ouvir quem
eram. E Marco Antônio depois de dizer cada nome e suas razões, concluía: “Mas,
fulano é um homem honrado”. E passava ao nome seguinte, explicitando as razões
e dizendo tratar-se de pessoa honrada. Assim, um por um, os assassinos foram
denunciados publicamente. Ao término do discurso o povo partiu furioso em busca
dos responsáveis pela morte do último governante da República Romana.
Júlio César governou num
período de crise. Antes dele, Roma se agitava em razão do empobrecimento da
população e da concentração das terras nas mãos da aristocracia. Dois irmãos
participavam desta agitação popular, Tibério Graco e Caio Graco. Eleitos
tribunos da plebe, representando os interesses dos pobres, foram assassinados.
Mas, antes de morrerem aprovaram leis importantes. Dentre tais leis estão a que
proibia o envio para a guerra de menores de 17 anos, a obrigação do Estado de
fornecer ‘um kit militar’ para os soldados convocados, a distribuição de trigo
a preço acessível para os pobres e a que mais contrariou os poderosos: a lei de
reforma agrária.
Assim como no Brasil, aqueles
que se apropriam de grandes quantidades de terras originariamente públicas não
aceitam a ideia de que outros igualmente possam tê-las. Tal como ocorre, no
Brasil, com os líderes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) ou
da Liga dos Camponeses Pobres (LCP), o destino dos dois irmãos reformadores foi
o assassinato. Mas dos seus sangues surgiu Júlio César que implementou algumas
reformas em benefício da população pobre, razão de sua morte.
O último recurso da política
é a força. Este é um conceito da Ciência Política. Mas a violência política
exercida pelo Estado é legítima quando socialmente autorizada e exercida de
acordo com o Direito. Daí a legitimidade das prisões em nosso sistema, depois
do trânsito em julgado. A violência política nas disputas pelo poder é
histórica. A publicação pela 'Folha de S. Paulo' da conversa da irmã do
ex-capitão Adriano da Nóbrega, na qual diz que houve nomeações para cargos
comissionados como prêmio por aquela morte, agitou as instituições brasileiras
nesta semana. O assassinato da vereadora Marielle Franco (Psol), no primeiro
mês da intervenção no Estado do Rio de Janeiro, com nomeação de um general para
interventor, depois alçado a ministro, tem permitido muitas cogitações, dentre
as quais razões políticas relativas à eleição presidencial de 2018.
Somente a apuração e a
publicidade dos interesses que levaram àquele atentado poderão aquietar as
especulações. Anteontem, dia 07, comemoramos o Dia do Jornalista e o
aniversário da fundação da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), que deverá
ter, a partir do próximo mês, a jornalista Cristina Serra em sua presidência,
primeira mulher a ocupar o cargo desde 1908. Este dia foi instituído como Dia
do Jornalista pela ABI, em 1931, centenário do golpe que destituiu D. Pedro I,
depois do assassinato do jornalista Líbero Badaró, crítico do Imperador. O
assassino se refugiou no Palácio do Ouvidor demonstrando o vínculo entre o
poder político e o crime. O Padre Feijó, membro do Conselho do Estado, foi um
dos responsáveis pela apuração do caso e punição dos culpados. Depois da abdicação
de D. Pedro I foi ministro da Justiça e Regente. Ainda ministro foi quem
recenseou as milícias e criou a Guarda Nacional.
Líbero Badaró, antes do
último suspiro, exclamou que morria defendendo a liberdade. Tal como Líbero
Badaró, jornalistas continuam sendo censurados, presos e assassinados no Brasil
numa brutal violação à liberdade de expressão garantida na Constituição da
República. A cada dia
mais precisamos defende-la, seja a crítica ácida de Líbero Badaró ou a denúncia
irônica de Marco Antônio. Quanto aos que podem ter responsabilidade no
assassinato da vereadora Marielle Franco, eu não ousaria fazer como Marco
Antônio e dizer ironicamente seus nomes, ainda que dissesse também serem homens
honrados.
Por hoje deixo de lado o
assunto da violência política em nossa sociedade e vou assistir à aula do
Professor Alexandre Leitão cantando a música da banda Engenheiros do Havaí,
‘Somos quem podemos ser’: “Quem ocupa o trono tem culpa. Quem oculta o crime também.
Quem duvida da vida tem culpa. Quem evita a dúvida também tem”.
Publicado originariamente no jornal O DIA, em 09/04/2022. Link: https://odia.ig.com.br/opiniao/2022/04/6376733-joao-batista-damasceno-homens-honrados.html
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