A Idade Média na Europa foi tomada pelo conceito de que o mundo era imutável e que tudo se fazia no tempo da natureza. O imobilismo tomava conta da realidade. Tratava-se de uma sociedade estratificada onde se dizia que os religiosos rezavam por todos, os nobres lutavam por todos e os trabalhadores trabalhavam por todos.
O
desenvolvimento de técnicas de produção implicou aumento da produção de comida
e formação de estoques. A consequência foi o aumento da população de ratos e,
posteriormente, a difusão da peste bubônica. Terça parte da população morreu. A
centralidade da religião foi colocada em dúvida e as pessoas passaram a começar a questionar as relações entre as causas e efeitos dos
fenômenos. Não subsistiu a ideia do determinismo no qual até então se acreditava.
A racionalidade
penetrou nas relações sociais e nos pensamentos e tudo passou a ser objeto de
tentativa de compreensão. O progresso técnico foi avassalador. Tudo passou a
ser objeto de estudo. Com a maçã que caiu de uma árvore, Isaac Newton formulou
a teoria que explica a Lei da Gravidade. Outros pensadores formularam outros
estudos. Com isto surgiu o tear, dinamizando a indústria têxtil, além de outras
máquinas.
O aumento da
técnica liberou mão de obra no campo, que era absorvida nas fábricas das
cidades. A ampliação das técnicas passou a implicar, também, a dispensa de mão
de obra nas cidades. A precarização da vida dos trabalhadores resultou em
jornadas de trabalho de 16 a 18 horas, fome, desamparo, ausência de moradias e
doenças. Logo os trabalhadores viram que o progresso estava sendo apropriado
por alguns em seu desproveito e começaram as rebeliões e revoltas.
Na Idade
Moderna, o mundo estava dividido entre as potências que o globalizaram, a
partir das Grandes Navegações. O colonialismo, embora tratado como atuação dos
portugueses e espanhóis, serviu a todos os países europeus. A Inglaterra
dinamizou sua indústria com o ouro das Minas Gerais que Portugal lhe fornecia.
Nos Países Baixos se concentravam os rentistas, banqueiros que ganhavam
dinheiro financiando empreitadas para espoliação do mundo. A França nunca
respeitou o tratado que dividira o Mundo Novo entre Portugal e Espanha e tomou
suas possessões. O mundo tinha donos e os povos estavam a eles submetidos.
Depois de
muitas revoltas e rebeliões, os trabalhadores descobriram que o poder político
era usado para manutenção dos interesses da classe dominante. Os trabalhadores
descobriram que as sociedades são constituídas por classes sociais e que a uns
cabe o trabalho e a outros a apropriação do trabalho social que a estes proporciona o enriquecimento.
No século XIX,
os trabalhadores ensaiaram a entrada na esfera política para defesa de seus
interesses e passaram a pretender a tomada do próprio Estado para que políticas
públicas fossem por eles editadas em seus próprios interesses e não apenas aos
das classes ricas. A luta dos trabalhadores para a tomada do poder desde o
século XIX deu origem aos partidos políticos, ao direito ao voto, à redução da
jornada de trabalho, às garantias sociais, à proteção na velhice, além de
outros direitos sociais.
A luta dos
trabalhadores por direitos foi uma luta contra os princípios do liberalismo que
diz deixar todos em igualdade de disputa para que, por seus próprios meios,
atinjam seus objetivos. Mas desconsidera-se a desigualdade originária. O
liberalismo acentua a miséria, pois a disputa sempre favorece os mais fortes.
Enquanto o mundo do trabalho cuida da sua subsistência, o capital soberanamente
administra os aparatos que lhe ampliam o poder político para a defesa dos seus
interesses econômicos.
Foi no século
XX que os trabalhadores mais se organizaram e tomaram a iniciativa para ampliar
sua participação política e empreenderam a luta anticolonial, a luta pela
libertação da humanidade, a luta pela emancipação dos povos oprimidos, a luta
pela emancipação feminina com direito e voto e à participação política, a luta
contra o racismo e muitas outras que acabaram por orientar a carta de
princípios conhecida como Declaração Universal dos Direitos da Pessoa
Humana.
O temor de que
tudo perdessem levou as classes ricas a buscar contentar os trabalhadores com
alguns direitos. Assim, após a 2ª Guerra Mundial foi instituído o Estado do
Bem-Estar Social. Foi a Era de Ouro da história do mundo do trabalho. Os erros
cometidos que levaram a um a revés na luta dos trabalhadores por seus direitos e emancipação, notadamente após a queda do Muro de Berlim, são
apresentados como triunfo do mundo do capital e derrota definitiva do mundo do
trabalho.
Já não se temem
as condutas do mundo do trabalho e os direitos estão sendo subtraídos e a
vida, precarizada. Mas tais erros não são fundamentos para o primado de
uma nova ordem que apenas semeia desigualdade, insegurança, miséria e
desamparo. A humanidade sempre se reinventou e haverá de se reinventar.
Publicado originariamente no jornal O
DIA, em 03/12/2022, pag. 14. Link: https://odia.ig.com.br/opiniao/2022/12/6533408-joao-batista-damasceno-a-transitoria-derrota-do-mundo-do-trabalho.html
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