quarta-feira, 16 de outubro de 2013

Perdemos todos!

“A Lei de Talião recomendava ‘olho por olho e dente por dente’.”
A Lei de Talião recomendava “olho por olho e dente por dente”. Para a época foi um avanço, pois estipulava limite para a retribuição do mal. Para Gandhi, isto deixaria o mundo cego. Não há o que comemorar na retribuição do mal com o mal. É o caso das prisões dos dez policiais acusados de tortura, assassinato e desaparecimento do corpo do pedreiro Amarildo. O saldo é lastimável: um trabalhador desaparecido, uma viúva, seis filhos órfãos e dez policias presos. Não há o que comemorar! 
Num debate público sobre violência desnecessária e ilegítima, um interlocutor, para quem a não violência é impunidade, ‘xingou-me’ de pacifista. Nunca imaginei esta palavra pronunciada em tom de acusação. Eu não me posicionara pela irresponsabilização. Apenas dizia que determinados fenômenos, como a política que propiciou a morte do Amarildo, a vitimação de sua família e as violações aos direitos nas áreas de UPPs, são temas complexos que não comportam respostas simplistas como prisões dos chamados ‘maus policiais’, ainda que devidas. 
O secretário Beltrame, no dia das prisões, disse que cada um deve ser responsabilizado pelo que faz. Não há como discordar. Mas é preciso saber que o direito penal e o poder disciplinar em nada melhorarão a atual política de segurança, da qual o secretário é um dos responsáveis. Outros policiais, de baixas patentes ou postos, treinados para o confronto, serão mandados para o ‘front’, onde arriscarão suas vidas — correrão risco de deixar seus filhos órfãos, suas mães, chorosas, e suas esposas, viúvas —, sentirão raiva dos que se assemelham aos que lhes foi ensinado a combater e também poderão violar direitos humanos. Mas os gestores da política de confronto e extermínio não serão incomodados. 
Para quem formula a política de segurança militarizada, pouco importa se morre um policial, um traficante ou um trabalhador. O Estado subtrai dos seus agentes os direitos e a compreensão do que fazem, os envolvem em microrrelações de poder e possibilita que os direitos da sociedade sejam subtraídos.

Publicado originariamente no jornal O DIA, de 16/10/2013, pág. 18.

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