“os crimes são
desatendimentos a comandos jurídicos do Estado, ente político. Daí é que todo
crime é político. Mas, as motivações podem ser políticas ou não. Um anarquista
que vá às ruas manifestar contra o poder político tem clara motivação política
e sua prisão tem esta natureza”.
Max Weber diz que há três fundamentos para o exercício do poder: mítico,
tradicional e racional-legal. Quem desobedece a um preceito religioso, do poder
mítico, comete pecado. Quem desatende ao pai ou ao ancião da comunidade
transgride um dever tradicional. Mas, os crimes são desatendimentos a comandos
jurídicos do Estado, ente político. Daí é que todo crime é político. Mas, as
motivações podem ser políticas ou não. Um anarquista que vá às ruas manifestar
contra o poder político tem clara motivação política e sua prisão tem esta
natureza. O Brasil tem o terceiro maior contingente carcerário do mundo,
proporcionalmente à sua população. Um terço aguarda julgamento.
Das centenas de milhares de decisões que proferi em 20 anos de carreira,
correspondentes às minhas convicções e concepção da ordem jurídica, relembro
com veemência de apenas uma: da guarda de um recém-nascido em Itaperuna, em
1994. Como andará aquela criança? A escolha do lar que fiz para ela, quando
mais de um era possível, foi a mais adequada?
No último domingo eu era o juiz plantonista da Cidade do Rio. Pela manhã,
recebi pedido de habeas corpus em favor de Baiano e o remeti ao Ministério
Público. No meio da tarde a autora perguntou pela decisão. Fui ao cartório
saber do processo. Não faltaram vozes contra o preso: que era manifestante
presente em todas as passeatas, desordeiro, vândalo etc... Eu apenas queria
informação sobre o paradeiro do processo. O habeas corpus questionava a
legalidade da prisão em flagrante e fora impetrado contra o delegado. Mas,
Baiano está preso em razão de prisão preventiva decretada judicialmente. No
plantão o juiz não pode reapreciar questões já decididas. Indeferi a liminar.
Não lhe pude restituir a liberdade com aquele habeas corpus.
No plantão, deixei de conversar com assessora de um subsecretário
municipal e receber ‘memorial prévio’ contra possíveis ações a serem propostas
relativas ao ‘Porto Maravilha’. Não recebi porque estranho é o judiciário
quando funciona fundado em razões que não sejam jurídicas.
Publicado originariamente no jornal O DIA, em 06/11/2013,pag. 20.
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