“As instituições podem ser
acusatórias e encarceradoras ou garantidoras de direitos, dependendo do modo
como atuam seus agentes; podem ser imprescindíveis à liberdade ou inúteis a
ela. Não há direito se não houver quem os queira assegurar; não há lei alguma
se não houver quem as queira cumprir.”
As leis e as instituições são o que as pessoas fazem delas
na prática. Pouco importa o que esteja nos papéis. Consumado o Golpe de 07 de
abril de 1831, que depôs D. Pedro I, no mesmo ano foi editada a Lei Feijó, visando
demonstrar à Coroa Britânica que o Brasil estava comprometido com a extinção do
comércio internacional de escravos. Foi uma lei ‘para inglês ver’, sem eficácia
ou intervenção na realidade. Daí a expressão. Fazendeiros e seus representantes
no Parlamento, bem como autoridades que compunham suas famílias, não tinham
interesse no seu cumprimento. A escravidão no Brasil durou até 1888, quando os ‘libertos’
foram expulsos das fazendas e entregues à própria sorte.
O Brasil neste período tinha promotores de justiça. Mas, não
tinha a instituição do Ministério Público. Alguns promotores perderam a vida na
defesa dos interesses dos excluídos, dentre os quais Ferreira Barbosa, sobre quem
escreveu Machado de Assis. A criação do MP é obra de Campos Sales, presidente
da república que institucionalizou o pacto coronelista revigorador do mando
local, desde que conveniente aos interesses do poder central. As instituições
jurídicas na 1ª República eram um braçodo poder dos coronéis; a polícia e as
milícias o outro, o braço forte.
As instituições ganharam novas feições ao longo do tempo. O
judiciário de hoje tem a estrutura dada pelo Pacote de Abril do Governo Geisel,
que fechou o Congresso Nacional em 1977 e editou emenda lhe atribuindo o
formato mantido após a redemocratização. O MP, com a Constituição de 1988,
ganhou novo formato e para isto contribuiu a atuação, na Constituinte, de
Sepúlveda Pertence, promotor de justiça cassado após a edição do AI-5. Ao MP
foram atribuídas novas funções; deixou de ser meramente acusatório e lhe foi estendida
a defesa dos interesses sociais, dentre os quais o direito à liberdade.
No Rio de Janeiro, o procurador de justiça Francisco Eduardo
Nabuco opinou pela concessão de habeas corpus a ativistas que haviam sido presos
para que não cometessem, no futuro, crime de dano. A pena para o crime de dano
é de 1 a 6 meses e mesmoacondenação mais gravosa não comporta privação de
liberdade.Foi um promotor de justiça de Nova Iorque quem defendeu a liberdade
do diplomata francês Dominique Strauss-Kahn, quando sequer seus advogados
sabiam da prova que o inocentava. Dominique era o principal adversário do
presidente francês Nicolas Sarkozy e foi vislumbrada conotação política em sua prisão
nos EUA.
As instituições podem ser acusatórias e encarceradoras ou
garantidoras de direitos, dependendo do modo como atuam seus agentes; podem ser
imprescindíveis à liberdade ou inúteis a ela. Não há direito se não houver quem
os queira assegurar; não há lei alguma se não houver quem as queira cumprir.
Publicado originariamente no jornal O DIA, em 17/08/2014,
pag. E6.
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