“Nas discussões sobre imbróglio
envolvendo juiz e agente público em Lei Seca não se analisaram o fato
originário, a sentença ou o acórdão. Cada um falou e escreveu de acordo com sua
imaginação. Roberto da Matta, antropólogo que fez tese sobre malandros e
carnaval, sentenciou: "Mexeu com um juiz, mexeu com todos".
"Todos" disse ele, desconsiderando a distinção das atuações no seio
da magistratura de acordo com as concepções filosóficas e ideológicas. Nada
como a Antropologia McDonald's para as generalizações, incompreensões dos
funcionamentos institucionais e opinião sobre o que não se estudou”.
Nas discussões sobre imbróglio envolvendo juiz e
agente público em Lei Seca não se analisaram o fato originário, a sentença ou o
acórdão. Cada um falou e escreveu de acordo com sua imaginação. Roberto da
Matta, antropólogo que fez tese sobre malandros e carnaval, sentenciou:
"Mexeu com um juiz, mexeu com todos". "Todos" disse ele,
desconsiderando a distinção das atuações no seio da magistratura de acordo com
as concepções filosóficas e ideológicas. Nada como a Antropologia McDonald's
para as generalizações, incompreensões dos funcionamentos institucionais e
opinião sobre o que não se estudou.
Depois do imbróglio na blitz, a agente de trânsito
— não se dando por satisfeita com sua 'autoridade no asfalto' — representou
contra o juiz no Tribunal de Justiça e perdeu. Depois moveu ação indenizatória
e perdeu. Recorreu ao tribunal que confirmou a sentença. Embargou e a decisão
foi de novo confirmada. Foi buscar lã e voltou tosquiada; deixou de ganhar e
foi condenada. Mas, a mídia lhe deu minutos de fama. É celebridade e uma
revista cogita convidá-la para suas páginas. Para mim o problema é anterior
àquela ocorrência concreta e se relaciona ao padrão de atuação dos agentes públicos.
Juiz é apenas o cargo a ser ocupado. Se ao invés de
dizermos "sou juiz" disséssemos "ocupo um cargo de juiz" ou
'trabalho como juiz" tiniríamos o título e teríamos maior liberdade para
sermos cidadãos, no dia a dia, e autoridade, no exercício da função. Mas,
tribunais incentivam a confusão e a hierarquização indevida. Quando se quer
atingir um juiz por ato praticado na vida privada diz-se que juiz é juiz o
tempo todo. Num julgamento no STF em que um dos seus membros era réu por
improbidade administrativa, falou-se que ministro não pode ser processado por
um juiz. As competências estão nas leis, mas o discurso hierárquico salvou o
ministro.
A ordem jurídica deve ser a referência dos agentes
públicos. Juízes não podem andar com carro novo sem placa, salvo até o órgão de
trânsito para o emplacamento, assim como agentes de trânsito não podem exigir
teste de bafômetro de nenhum cidadão, salvo se envolvido em acidente de
trânsito ou, justificadamente, sob fiscalização. É a lei. Policiais não podem
revistar carros ou pessoas, salvo se diante de suspeita fundamentada. É a Lei.
Em abordagens, todos devem ser tratados com urbanidade. Na disputa da
prevalência da carteirada e de quem tem força no Estado Policial, perdem a
cidadania e o Estado de Direito.
Publicado
originariamente no jornal O DIA, em 16/11/2014, pag. E7.
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