“As manifestações de 2015 não se relacionam com as
jornadas de 2013. Aquelas tinham pauta, embora difusa, que incluía melhoria no
transporte público. Mas jovens foram presos, o movimento social, criminalizado,
policiais da Força Nacional atuaram — à margem da lei — como infiltrados, e
seus depoimentos se prestam ao liberticídio. O acolhimento das demandas das
jornadas de 2013 poderia ter produzido fortes defensores da democracia e não se
precisaria pagar a manifestante para apoiar as instituições, ameaçadas pelo
golpismo. "Sem o povo não adiantam as fortalezas", escreveu Maquiavel
em 1513, pois em tempo de crise elas se voltam contra o príncipe”.
Todo o poder pertence ao povo, que o exerce, também, diretamente.
Manifestação é forma de democracia direta e auxilia as instituições nas crises
de representatividade. Daí a legitimidade das manifestações do domingo passado.
Mas pesquisas demonstraram a presença de poucos jovens, marcante em eventos
onde o desejo de justiça e felicidade se posta no horizonte e os guia rumo à
utopia.
Alguns dos jovens presentes acompanhavam parentes mais velhos, a quem
recorriam para responder o que lhes era perguntado. O resultado não poderia ser
outro senão ódio, preconceito de classe, ressentimentos, grosserias,
ostentações, afetações e esnobismos próprios de provincianos de um país
periférico. A maioria era branca, com mais de 30 anos e renda mensal superior a
10 salários mínimos. Uma mulher negra, com roupa branca, carregava uma criança
loira, acompanhando um casal que clamava por moralidade vestindo camisa da CBF.
Era a babá auxiliando o protesto da 'Casa Grande'.
A ausência de políticas sociais efetivas recolocou o Brasil na 1a.
República. Os lucros dos bancos nunca foram maiores, as políticas sociais se
resumem ao assistencialismo, mesmo sem clientelismo, e os serviços públicos
foram destroçados. Um médico que trabalha num hospital público do Rio, por 24
horas semanais, recebe R$ 1,4 mil mensais. Proliferam as privatizações — a dos
hospitais, por meio das OSs. Saúde, transporte e Educação são uma calamidade,
apesar do discurso oficial que aponta — com cabeça nas nuvens e os pés fora do
chão — prefeito aliado como o melhor das galáxias. A classe média agoniza e,
instigada, esperneia. Cumpre o seu papel de classe em tempo de crise.
Perdedores inconformados querem o 3o. turno e pedem intervenção
militar. Mas foi o governo federal quem primeiro deu sinais de que problemas
políticos e sociais podem ser sanados com as Forças Armadas. Visita ao Complexo
da Maré, onde são constantes as violações aos direitos humanos, o demonstra.
Isto sem falar na criação, à margem da Constituição, da Força Nacional, tal
como o Regente Feijó criara a Guarda Nacional, aparato que deu suporte ao pacto
coronelista.
As manifestações de 2015 não se relacionam com as jornadas de 2013.
Aquelas tinham pauta, embora difusa, que incluía melhoria no transporte
público. Mas jovens foram presos, o movimento social, criminalizado, policiais
da Força Nacional atuaram — à margem da lei — como infiltrados, e seus
depoimentos se prestam ao liberticídio. O acolhimento das demandas das jornadas
de 2013 poderia ter produzido fortes defensores da democracia e não se
precisaria pagar a manifestante para apoiar as instituições, ameaçadas pelo
golpismo. "Sem o povo não adiantam as fortalezas", escreveu Maquiavel
em 1513, pois em tempo de crise elas se voltam contra o príncipe.
Publicado originariamente no jornal O DIA, em 22/03/2015, pag. E6. Link:
http://odia.ig.com.br/noticia/opiniao/
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