segunda-feira, 9 de maio de 2016

Num Estado Democrático, juízes não podem tudo

"Num Estado de Direito, os agentes públicos têm competência nos limites da atribuição legal. Fora de marcos legais, os agentes públicos podem tudo o que julgam capazes. Duas decisões judiciais durante a semana passada colocaram o judiciário no centro dos debates sobre o poder dos juízes. Um juiz, a pretexto de coagir o Facebook a fornecer conteúdo de postagens no WhatsApp, suspendeu todo o serviço no país, causando danos a milhões de usuários. Poderia ter fixado multa diária até o fornecimento das informações desejadas. A outra decisão foi a liminar de um ministro do STF que suspendeu o exercício do mandato do deputado Eduardo Cunha".
Num Estado de Direito, os agentes públicos têm competência nos limites da atribuição legal. Fora de marcos legais, os agentes públicos podem tudo o que julgam capazes. Duas decisões judiciais durante a semana passada colocaram o judiciário no centro dos debates sobre o poder dos juízes. Um juiz, a pretexto de coagir o Facebook a fornecer conteúdo de postagens no WhatsApp, suspendeu todo o serviço no país, causando danos a milhões de usuários. Poderia ter fixado multa diária até o fornecimento das informações desejadas. A outra decisão foi a liminar de um ministro do STF que suspendeu o exercício do mandato do deputado Eduardo Cunha.
A mídia percebeu a exorbitância do juiz sergipano e o apelidou de ‘Sérgio Moro de Lagarto’, município onde atua. No meio jurídico diz-se a frase: "Que pereça o mundo, mas que se faça justiça". Trata-se de concepção de justiça exterior ao mundo e em nome do que se pode extinguir o planeta e o que nele habita; é concepção que não compreende a justiça como decorrência das relações sociais para a convivência saudável. Se o mundo perecer, pereceremos todos e o que concebemos como justiça.
O colega sergipano disse estar “à mercê de Deus e um dos predicados que todo magistrado deve ter é justamente o da coragem. Vim aqui para servir em nome de Deus e cumprir uma missão. E aqui cumprirei minha missão, doa a quem doer”. O compromisso dos juízes há de ser com a ordem jurídica democrática e republicana. Mas tais exorbitâncias não são motivos para instauração de procedimento disciplinar contra o juiz. De decisão judicial se recorre às instâncias superiores.
Não se pode instaurar procedimento disciplinar em decorrência de decisão judicial, sob pena de abrirmos precedente e termos juízes temerosos quando tiverem que decidir contra os poderosos. A independência judicial é fundamental para a garantia dos direitos.
A outra decisão foi a liminar do ministro do STF, que tardiamente afastou o deputado Eduardo Cunha do exercício de mandato. Se proferida tão logo ajuizada a ação, em dezembro de 2015, ou antes de 17 de abril, a história do Brasil poderia ser outra. Justiça que tarda falha. Retardamento ou omissão favorece a injustiça.
 

Publicado originariamente no jornal O DIA, em 08/05/2016, pag. 16. Link: http://odia.ig.com.br/opiniao/2016-05-08/joao-batista-damasceno-num-estado-democratico-juizes-nao-podem-tudo.html

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