A violência e o medo estão no ar que
respiramos. Dois homens de bem, educados e instruídos, desentenderam-se.
Acreditando que iria ser agredido, um deles prepara-se para se defender de uma
putativa agressão. Esse fato é agravado pelos modernos meios à nossa disposição
e mostra bem que nenhum estava em seu equilíbrio habitual, portanto, sem
entender o caráter violento dos fatos.
O episódio passaria despercebido na
crônica de violência de uma cidade habituada com a morte, sem qualquer emoção,
não fossem magistrados os envolvidos. Magistrados, seres humanos falíveis como
somos, estamos sujeitos às emoções, embora culturalmente e institucionalmente
sejamos impedidos de sê-los.
Passado o calor da emoção, ambos
dialogam e resolvem, como cidadãos de bem, submeter-se a um processo de
mediação de conflitos e se reconciliam, selando a paz entre os homens de boa vontade,
como prega o Bom Rabino. Esse abraço reconciliatório se deu no gabinete do
presidente do Tribunal, que o presencia, assim como outros julgadores, que se
transmudam em testemunhas da grandeza da pacificação.
O Tribunal de Justiça do Rio tem se
destacado no país por incentivar a solução dos conflitos, alcançando um
entendimento satisfatório, “sem a necessidade de submeter-se ao desgaste
financeiro e emocional de um processo.” Estimulados por esse princípio, os dois
contendores, em efêmera situação adversa, materializaram a paz com um
pacificador abraço, regado por sinceras lágrimas de emoção, arrependimento e
perdão mútuos. A mediação apregoada foi exitosa, e a paz abrilhantou a
assinatura de acordo em que ambos desistiram de ação que contrariasse os
objetivos abençoados da Justiça de plantar a paz na sociedade.
Nenhum tribunal há de permitir que se
contrariem esses objetivos. Apenas nos regimes de exceção, tribunais ousaram
servir a princípios contra a dignidade humana. Assim, o holocausto foi fruto da
homologação por tribunais que perseguiram pessoas etnicamente diversas em nome
de suposta superioridade racial dos poderosos.
Uma vez selada a paz entre os
contendores, espera-se em qualquer outra medida que não seja o respeito à
vontade das partes legitimadas que se reconheça o inconfundível cheiro de
exceção. Não se pode imaginar a imagem contraditória do plantar conflitos onde
já há a paz por iniciativa daqueles cuja principal missão é buscá-la.
Publoicado
originariamente no jornal O DIA, em 03/06/2015, pag. 8. Link: http://odia.ig.com.br/noticia/opiniao/2015-06-03/siro-darlan-um-tribunal-de-excecao.html
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