A atuação da PM no fim de semana
passado, ao impedir a chegada de centenas de jovens pobres da periferia às
praias da Zona Sul, demanda responsabilização dos autores da atrocidade e de
toda a cadeia de comando que a ordenou ou compactuou. Trata-se violação ao
direito constitucional de ir e vir, a denotar a responsabilização até do
governador.
Ao contrário da retratação esperada,
diante de abuso de autoridade, a PM afirmou, em nota, que “as ações preventivas
têm por objetivo encaminhar para os abrigos da prefeitura crianças e
adolescentes em situação de risco. Muitos desses jovens, além de estar nas ruas
sem dinheiro para alimentação e transporte, apresentam condição de extrema
vulnerabilidade pela ausência de familiares ou responsáveis”.
No Centro Integrado de Atendimento à
Criança e ao Adolescente, para onde foram levados em micro-ônibus da PM, os
jovens pobres que iam à praia foram mantidos durante todo o dia sem água e
comida até a chegada dos responsáveis; foram preenchidas fichas com seus dados
pessoais e obrigados a responder a perguntas sobre drogas e destinos. A Secretaria
de Desenvolvimento Social limitou-se a dizer que “quem define os critérios ou
quem será levado é a PM”.
Se não há motivo para decretação de
prisão, o direito de ir e vir é pleno e não pode ser cerceado. A prisão somente
se autoriza em flagrante de delito ou ordem escrita de autoridade judicial
competente. Inexiste no Direito brasileiro condução para averiguação. Esta
espécie de abuso cometida contra Amarildo não ensinou nada ao comando da PM,
nem aos governantes que deveriam ditar-lhe o modo de funcionamento. As praias
são bem de uso comum do povo, e uma pessoa não pode ser impedida de nela ter
lazer, por ser negra ou pobre.
O fato representa grave violação aos
direitos constitucionais. Mas o governador Pezão não criticou a ação da polícia
e afirmou que foi realizada para evitar arrastões e outros crimes cometidos nas
praias por adolescentes. E mais, que a polícia “tem visto e mapeado com
inteligência toda essa movimentação de menores, desde o embarque nos ônibus”.
Se à luz do dia policiais podem impedir jovens pobres de ir à praia, o que não
podem fazer se os encontrar à noite num beco escuro na periferia?
Publicado
originariamente no jornal O DIA, em 30/08/2015, pag. 18. Link: http://odia.ig.com.br/noticia/opiniao/2015-08-29/joao-batista-damasceno-segregacao-dos-pobres-em-plena-luz-do-dia.html