O dramaturgo Nelson Rodrigues nasceu em Recife em 1912. Aos 4 anos veio para o Rio de Janeiro e aos 6 sobreviveu à gripe espanhola. Aos 17, em 1929, conheceu o sentido trágico da vida, título de obra de um dos mais renomados intelectuais da época, Miguel de Unamuno. De formação conservadora, presenciou o assassinato de seu irmão Roberto Rodrigues, na redação do jornal Crítica, do seu pai Mário Rodrigues.
Por causa de uma matéria sensacionalista tratando do divórcio da escritora Sylvia Serafim Thibau e do médico Dr. João Thibau, filho de um dos auxiliares de Oswaldo Cruz no Instituto de Manguinhos, intitulada “Um rumoroso caso de desquite”, a militante pelo sufrágio feminino foi à redação do jornal a procura de Mário Rodrigues. Ante sua ausência declarou que fora até a redação para matar Mário Rodrigues ou quaisquer de seus filhos. Assim, sacou uma arma e matou Roberto Rodrigues na frente do irmão adolescente.
Poucos meses após a morte do irmão, o pai
Mário Rodrigues teve um AVC e também morreu, deixando a família sem meios de
sustento. Mário Rodrigues Filho, que jogava sinuca com o jovem Roberto Marinho
foi trabalhar no jornal O Globo, recém fundado, e criou a crônica esportiva.
Foi também Mário Rodrigues Filho quem organizou o primeiro desfile de escolas
de samba, sob o patrocínio do jornal onde trabalhava. Mais tarde fundou o
Jornal dos Sports. Mário Filho dá merecido nome ao Maracanã.
A Crítica, jornal do pai de Nelson
Rodrigues, era financiado pelo vice-presidente da República, Melo Vianna, um
jurista mineiro negro que, depois de ter sido juiz de direito em Carangola/MG,
ingressou na política, foi governador de Minas Gerais e no rodízio da República
do Café com Leite foi vice-presidente de Washington Luiz, deposto pela
Revolução de 1930. Mas, retornou ao cenário político como presidente da
Assembleia
Nacional Constituinte de 1946.
O período revolucionário de 1930 foi trágico
para a família de Nelson Rodrigues. Dois membros da família faleceram de forma
assombrosa, os revolucionários agitaram o país e denunciaram o conservadorismo
do jornal Crítica, as mulheres em suas campanhas pelo direito ao voto saíram em
defesa da homicida, com o apoio de parcelada imprensa comprometida com a
Aliança Liberal, as sufragistas apoiaram Sylvia Serafim, pois matara em defesa
da honra atingida por um artigo de jornal. Em outubro de 1930, os
revolucionários venceram e o jornal Crítica foi empastelado e incendiado. Para
concluir, Sylvia Thibau foi absolvida, sob os aplausos da sociedade.
Tais ocorrências acentuaram o horror de
Nelson Rodrigues pelo clamor popular. Os jovens tenentes, promovidos a
capitães, tinham uma concepção de política e de organização social sob a
direção das elites institucionais, com discursos moralistas. Nelson Rodrigues
relatava a hipocrisia da lisura aparente e a devassidão na vida privada.
Conservadoramente, denunciava a moral burguesa.
Num só ato Nelson Rodrigues conheceu a
tragédia, retratada na morte do irmão, o acaso, pois poderia ter sido o alvo do
disparo, e o cinismo, concepção filosófica para a qual a busca da felicidade
consiste em permanecer alheio às dores do mundo e indiferente aos que sofrem.
Mas, o mundo que precisamos construir demanda compaixão mediante
compartilhamento do sentimento alheio.