O conhecimento
da identidade de um povo ou de um grupo social está ligado à memória. As
ocorrências que a compõem tanto podem ser documentadas quanto narradas pelos
que a viveram ou sobre ela ouviram. A identidade de um povo, capaz de lhe
caracterizar como nação, decorre da sua história. Mas fatos são ocorrências
concretas no mundo natural e sua existência se esvai com o próprio
acontecimento, restando apenas as narrativas a serem encontradas pelo
pesquisador.
O trabalho do
pesquisador consiste em tentar reconstituir historicamente os fatos. Tal como
um juiz que não julga os fatos, porque não os vivenciou, mas apenas as
narrativas sobre ele, o pesquisador reconstitui ocorrências, a partir de
vestígios, para conhecimento de terceiros. A história é um meio de preservação
da memória e é fundamental para a compreensão da nossa identidade. Não se
constrói uma nação sem memória, identidade e história.
Nação é um
conjunto de pessoas unidas pela mesma história, características culturais, tradições,
língua, costumes, dentre outros fatores capazes que lhes dar identidade e pelos
quais os indivíduos pertencentes a um grupo se identificam e se sentem partes
de um todo. Diversamente, pátria indica a terra natal ou adotiva de uma pessoa
que a ela se liga por vínculos afetivos e valores. Nem sempre os patriotas se
identificam com o povo e às vezes até o maldiz.
Neste ano de
2022 comemoramos o centenário de importantes acontecimentos, dentre os quais, o
nascimento do ex-governador Leonel Brizola, nacionalista e popular, do
antropólogo Darcy Ribeiro, da Semana de Arte Moderna, do Levante do Forte de
Copacabana e da fundação do Partido Comunista (PCB). Comemoramos também o
bicentenário da data oficial de Independência do Brasil.
A Semana de
Arte Moderna ocorreu em São Paulo, entre 13 e 17 de fevereiro, no Teatro
Municipal da cidade. Embora muitas das questões debatidas na Semana já
estivessem no seio da sociedade, seu mérito foi o de reunir num mesmo lugar e
ao mesmo tempo o que pulsava na sociedade. Foi um marco na nossa história. Cada
dia da semana foi reservado para uma atividade cultural: pintura, escultura,
poesia, literatura e música. O evento marcou o início do Modernismo no Brasil e
tornou-se referência cultural do século XX. Washington Luis, que era um
político que tinha cultura e sabia o seu valor, apoiou e patrocinou a Semana de
22.
O Partido
Comunista (PCB) foi fundado no dia 25 de março, na cidade de Niterói, por nove
delegados, representando 50 membros. É um marco na organização do mundo do
trabalho em seu conflito inconciliável com o mundo do capital. O poeta Ferreira
Gullar em poema de 1982 escreveu: “...quem contar a história de nosso povo e
seus heróis tem que falar dele. Ou estará mentindo”.
Em 5 de julho,
jovens militares idealistas irromperam uma rebelião, a Revolta dos 18 do Forte
de Copacabana. Deles sobreviveram apenas Siqueira Campos e Eduardo Gomes. Este
foi ministro da Aeronáutica e concorreu à Presidência da República duas vezes e
dá nome ao Parque do Flamengo. Aquele, falecido às vésperas da Revolução de
1930, dá nome a rua em Copacabana. Compõem a nossa história nacional e local.
Em 26 de
outubro nasceu o sociólogo, antropólogo, escritor e educador Darcy Ribeiro.
Darcy dedicou a sua vida aos indígenas e à educação no Brasil. Em 1959 foi um
dos subscritores do manifesto dos educadores por uma lei nacional de educação.
Em 1961, no Governo João Goulart, do qual foi Chefe da Casa Civil e Ministro da
Educação, foi editada a primeira lei a fixar ‘Diretrizes e Bases para a
Educação Nacional’ no Brasil.
Nos governos
Brizola no Rio de Janeiro, de 1984 a 1987 e 1991 a 1994, Darcy impulsionou a
área da educação e promoveu o mais extraordinário projeto educacional do
Brasil, a construção dos CIEPS, onde crianças podiam estudar, praticar esporte,
se alimentar, receber cuidados médicos e odontológicos e se socializarem para a
vida no convívio com outras crianças.
O ano de 1922
foi emblemático. Algumas das ocorrências foram listadas acima. Sequer tratei do
que se fez no Rio de Janeiro para a comemoração do centenário da Independência,
dentre o que a demolição do Morro do Castelo e o aterro para a construção da
Urca. Igualmente não tratei do primeiro evento cujo centenário se comemora
neste ano, o nascimento do ex-governador Leonel Brizola, em 22 de janeiro de
1922. Fica para artigo futuro.
Publicado
originariamente no jornal O DIA, em 29/01/2022, pag. 14. Link: https://odia.ig.com.br/opiniao/2022/01/6326228-joao-batista-damasceno1922-2022-centenario-de-brizola.html