Na terça feira (18) uma notícia se alastrou pelas
redes sociais e jornais digitais comunicando a morte de Noam Chomsky. O
estadunidense de 95 anos, linguista, filósofo, sociólogo, cientista cognitivo e
um dos mais renomados personagens do campo da filosofia analista estava em São
Paulo para tratamento médico, acompanhado de sua mulher brasileira. Em menos de
uma hora as empresas de comunicação começaram a apagar as matérias. Chomsky não
só estava vivo como havia recebido alta hospitalar. A velocidade da vida
contemporânea, a falta de recursos das empresas de comunicação e a necessidade
de publicar antes da concorrência facilita a publicação de matérias sem prévia
e adequada apuração.
Chomsky é pouco conhecido da sociedade brasileira.
Sua influência ocorre sobretudo nas universidades, no campo das ciências
humanas, filosofia e letras. Mas neste momento em que tanto se discute sobre o
modelo educacional no Brasil talvez devêssemos voltar nossa atenção para o que
pensou ao longo da sua vida profissional. Não se trata de um iniciante, nem de
alguém sem contribuição a dar num momento de tomada de decisão.
Noam Chomsky é Professor Emérito em Linguística do
Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), onde atua há mais de 40 anos.
Crítico do behaviorismo ou comportamentalismo, empregado nas escolas
cívico-militares, seus trabalhos contribuem decisivamente para a formação da
psicologia cognitiva, no domínio das ciências humanas. Antes de receber seu
doutoramento em linguística pela Universidade da Pensilvânia, em 1955, ele
realizou a maior parte de suas pesquisas na Universidade Harvard. Chomsky
pesquisa, escreve e ensina e é indiscutivelmente o mais importante intelectual
vivo da atualidade.
Jamais ouvira falar de Noam Chomsky até que em 1984
caiu-me nas mãos um exemplar da revista COMUM, editada pela Faculdade de
Comunicação Hélio Alonso, FACHA, do ano de 1981. Era o número 8 de uma série
que atingiria algumas dezenas, todas digitalizadas e disponíveis na internet.
Um banquete para quem se interessa pelos temas da comunicação, educação e
linguagem.
O editorial daquela revista tratava da crise na
universidade brasileira na definição política, teórica e ideológica, depois de
longo período de autoritarismo que nos fora imposto pelo regime
empresarial-militar e que fragilizara as instituições acadêmicas de tal forma,
que se mostravam incapazes de compreender e acompanhar o processo de
transformação política do país. Já cursando a faculdade de Direito, naquele ano
decidi cursar também Ciências Sociais, área na qual acabei por concluir
completa formação com mestrado e doutorado.
Darcy Ribeiro dizia que “a crise na educação
brasileira não é crise: é um projeto”. Darcy compartilhava com Anísio Teixeira,
autor do Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova de 1932, e que fora jogado no
poço de um elevador durante o Governo Médici, em 1971, a ideia de que é preciso
educar para a vida e não apenas formar para certas finalidades. Em 1959 Darcy
Ribeiro e Anisio Teixeira subscreveram outro manifesto sobre educação do qual
resultou a primeira lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, em 1961, no
Governo Jango. Nos 460 anos anteriores faltaram-nos preocupação real com a
educação. Darcy Ribeiro, além dos CIEPs (Brizolões) com educação integral em
tempo integral, criou duas universidades: A Universidade de Brasília (UNB) e a
Universidade Estadual do Norte Fluminense (UENF) que tem o seu nome.
Todos nascemos indivíduos. Tornamo-nos pessoas e
pelos processos de socialização e interação, adquirimos outras qualidades,
dentre as quais a de cidadãos. Educar é estabelecer as bases para a vida e a
liberdade. Formar é moldar a uma forma pré-determinada para atender a
interesses de terceiros. Educar é preparar a pessoa para a autorrealização.
Formar é adestrar para responder a estímulo: Marcha! Alto! Direita, volver!
Avança! Recue! Morra! Eis a questão a que querem subordinar os filhos da classe
trabalhadora: robotização para torná-los vassalos úteis. Não se propõem escolas
cívico-militares para os filhos da classe dominante.
Nesta coluna não há pertinência, nem espaço para
discutir o que é o behaviorismo ou comportamentalismo, criticado por Chomsky,
ou às ideias de um psicólogo chamado Skinner ou de Pavlov. Mas para
exemplificar lembremos que Pavlov tocava um sino e dava comida aos seus cães.
Em certo dia tocou o sino e não deu a comida. Os cães, adestrados a comer ao
ouvirem o sino, salivaram tal como se estivessem diante da comida. A crítica de
Noam Chomsky à psicologia behaviorista ou comportamentalista, que pretendem adotar
nas escolas públicas brasileiras, decorre do fato de que seu objetivo é
instituir previsão e controle sobre o comportamento das pessoas, afastando-as
da introspecção e da reflexão. O método que se pretende implantar visa a
conseguir um esquema unitário dos comportamentos automatizados e irrefletidos
ou condicionamentos, sem distinguir a linha divisória entre o Ser Humano e um
animal. Mas não somos bestas! Não somos gado! Não nos guiaremos como rebanho,
pastoreados para o precipício. Chomsky vive! E vive a inteligência.
Publicado originariamente
no jornal O DIA, em 29/06/2024, pag. 12. Link: https://odia.ig.com.br/opiniao/2024/06/6872973-joao-batista-damasceno-noam-chomsky-vive-e-vive-a-inteligencia.html