“Neste contexto de
ascensão da truculência no Brasil, onde a civilidade está sendo substituída
pela violência, é preocupante a formação no seio de seitas neopentecostais de
grupos de “gladiadores de Cristo”. Igualmente a reunião, em ato religioso, de
militares do Exército fardados e armados pelo Estado, onde se declaram “prontos
para vencer o Mal”, tal como na Maré, sem explicitar que Mal vão exterminar”.
A Constituição assegura a liberdade
de associação, mas veda a de caráter paramilitar. O Código Civil classificava
as pessoas jurídicas de direito privado em associações, sociedades, fundações e
firmas individuais. Em 2003 o texto foi alterado, passando a distinguir
partidos políticos e organizações religiosas. Mas o caráter paramilitar
continua vedado a todos.
Ser paramilitar não implica a defesa
de atos violentos nem o uso de armas. O que o caracteriza é a natureza da
organização e a estrutura funcional fundada em disciplina e hierarquia,
compreendendo o planejamento de ação pela direção e execução pelos
subordinados. O uso de uniforme apenas exterioriza a natureza paramilitar, mas
não é requisito para sua existência, assim como hinos e palavras de ordem.
Neste contexto de ascensão da
truculência no Brasil, onde a civilidade está sendo substituída pela violência,
é preocupante a formação no seio de seitas neopentecostais de grupos de
“gladiadores de Cristo”. Igualmente a reunião, em ato religioso, de militares
do Exército fardados e armados pelo Estado, onde se declaram “prontos para
vencer o Mal”, tal como na Maré, sem explicitar que Mal vão exterminar.
Da mesma forma é preocupante a
disposição de PMs em forma — com armas pesadas em punho — onde repetem os
gritos do comando, tais como “somos autoridades instituídas pelo Senhor”,
quando são apenas agentes de autoridade numa democracia, e não autoridades ou
guerreiros míticos numa teocracia. E mais, gritam que “pelo Senhor lutamos”,
possibilitando incompreensão dos limites legais para a própria atuação.
O nazismo teve raízes míticas, dentre
as quais a crença na força Vril, que se acreditava capaz de despertar o
passado. Não sem razão a suástica nazista era no sentido anti-horário, evocando
o que se encontrava no subterrâneo e na irracionalidade.
Foi a formação de grupos religiosos e
simpáticos ao nazismo — como a Liga de Defesa Nacional Cristã e a Legião do
Arcanjo Gabriel (transformada em Movimento Nacionalista da Guarda de Ferro, nos
anos 1920 na Romênia) —, que por meio de perseguições aos judeus e
trabalhadores de esquerda fez fugir para o Brasil a família Gleiser, composta
também por Berta Gleiser, que 20 anos depois se casaria com o antropólogo Darcy
Ribeiro. A história somente se repete como farsa, mas pode produzir similares
danos se desconsiderada em momento no qual havemos de defender as liberdades.
Publicado
originariamente no jornal O DIA, em 29/03/2015, pag E6. Link: http://odia.ig.com.br/noticia/opiniao/2015-03-28/joao-batista-damasceno-militarismo-e-misticismo.html