“Defender
o Estado de Direito e o regramento da atuação estatal é a garantia que todos
teremos de que amanhã o monstro repressivo não sairá do esgoto para nos tirar o
sono. Juízes são cidadãos e têm o direito à manifestação do pensamento e
posicionamentos ideológicos que não se constituam em reiterada conduta
político-partidária. Devem reservar a toga para pronunciamento de julgamentos
em garantias dos direitos, não para expressões de apoio a quem persegue seus
antagonistas de classe. Se não defendermos as garantias constitucionais para
todos, chegará o tempo em que não subsistirão para ninguém”.
A ideia de que as sociedades devem
ser regidas por leis, e não por vontades pessoais, remonta a Aristóteles. O
filósofo grego nos deixou obras que fundam o pensamento político ocidental na
política e na ética. É dele a concepção de que é melhor ser governado pelas
leis que pela vontade de um qualquer, e disto decorreu o Estado de Direito.
Neste, agentes públicos atuam de acordo com a lei, quando por ela autorizados,
e não em seus sentimentos pessoais, e particulares podem tudo o que a lei não
proíbe.
Em momento no qual instituições
democráticas vivem assacadas, com criminalização das práticas sociais e
interpretações capazes de imputações de crimes a quem não os cometeu, a defesa
do Estado de Direito é meio de contenção do fascismo em ascensão.
As gerações futuras haverão de olhar
para o tempo no qual estamos vivendo e se assombrar com o que fazemos. Da
redemocratização do país e edição da Constituição de 1988 às ‘Jornadas de
Junho’ de 2013, jamais experimentamos tamanho obscurantismo. A criminalização
dos movimentos sociais e das manifestações populares teve total apoio do
ministro da Justiça da presidente Dilma, José Eduardo Cardozo.
Foi emblemática a prisão de
estudantes e a condenação de um morador de rua, Rafael Braga, por suposta posse
de coquetel molotov, quando o que possuía era um frasco com detergente com o
qual higienizava os locais onde dormia. A condenação ocorreu sem que o
Judiciário determinasse perícia no material apreendido. Mas o ministro que
apoiava a criminalização não concebia que a presidente poderia vir a ser
acusada de crime de responsabilidade quando igualmente não se está diante de
crime.
Defender o Estado de Direito e o
regramento da atuação estatal é a garantia que todos teremos de que amanhã o
monstro repressivo não sairá do esgoto para nos tirar o sono. Juízes são
cidadãos e têm o direito à manifestação do pensamento e posicionamentos
ideológicos que não se constituam em reiterada conduta político-partidária.
Devem reservar a toga para pronunciamento de julgamentos em garantias dos
direitos, não para expressões de apoio a quem persegue seus antagonistas de
classe. Se não defendermos as garantias constitucionais para todos, chegará o
tempo em que não subsistirão para ninguém.
Publicado
originariamente no jornal O DIA, em 19/06/2016, pag. 18. Link: http://odia.ig.com.br/opiniao/2016-06-18/joao-batista-damasceno-que-mande-a-lei-nao-caprichos.html