sábado, 21 de maio de 2022
Proibicionismo, Marcha da Maconha e policiais antifascismo
sábado, 7 de maio de 2022
O suicídio de Vargas e a deposição de Dilma: fundamentos comuns
A operação Lava Jato não passou de uma
estratégia bem-sucedida dos Estados Unidos para minar a autonomia geopolítica
brasileira. Preocupava os EUA o crescimento de empresas que colocariam em risco
seus próprios interesses e a falta de completa submissão do Brasil à sua
política externa.
Em 2007, durante o governo de George Bush as
autoridades estadunidenses demonstraram incômodo com a falta de cooperação
brasileira com sua política intervencionista a pretexto de combate ao
terrorismo. O Brasil não se mostrou disposto a embarcar na histeria
estadunidense. Demonstrando alguma contribuição, o Brasil se dispôs a criar um
grupo de especialistas e aprender os métodos estadunidenses.
Naquele ano, o juiz Sergio Moro foi
convidado a participar de um encontro, financiado pelo Departamento de Estado
dos EUA, e fez contato com diversos representantes do FBI, do Departamento de
Justiça e do próprio Departamento de Estado. Simultaneamente, os EUA criaram um
posto de "conselheiro jurídico" na sua embaixada no Brasil, a cargo
de Karine Moreno-Taxman, especialista em combate à lavagem de dinheiro e ao
terrorismo.
Em 2009, Karine Moreno-Taxman discursou na
conferência anual dos agentes da Polícia Federal brasileira, em Fortaleza.
Diante de mais de 500 profissionais ensinou os brasileiros a fazer o que os EUA
queriam: "Em casos de corrupção, é preciso ir atrás do 'rei' de maneira
sistemática e constante, para derrubá-lo. Para que o Judiciário possa condenar
alguém por corrupção, é preciso que o povo odeie essa pessoa", afirmou.
Sendo mais explícita disse que: "A sociedade deve sentir que ele realmente
abusou de seu cargo e exigir sua condenação". Nenhum nome foi citado e nem
precisava.
O governo brasileiro não viu o monstro que
estava sendo criado. Ao contrário, a eleição da presidente Dilma em 2010
pavimentou o caminho. Seus auxiliares pouco demonstraram conhecer das
instituições políticas brasileiras e negligenciaram o papel dos EUA na nossa
política interna. Um grupo anticorrupção da OCDE, amplamente influenciado pelos
EUA, começou a pressionar o Brasil por leis mais duras de combate à corrupção.
Os EUA implementaram um programa chamado
“Projeto Pontes" para disseminar os seus métodos consistentes na criação
de grupos de trabalho anticorrupção, aplicação de sua doutrina jurídica que
inclui um sistema de recompensa para as delações e o compartilhamento
"informal" de informações sobre os processos, ou seja, fora dos
canais oficiais.
Em 2013, por pressão dos EUA, o Brasil
aprovou a lei anticorrupção. Naquele mesmo ano o procurador geral adjunto
estadunidense, James Cole, anunciou a vinda de agentes estadunidenses com o
intuito de "instruir procuradores brasileiros". Juristas destacaram o
caráter "imprevisível e contraditório" da lei e a ausência de
procedimentos de controle e, preocupados, alertaram sobre a possibilidade de
qualquer membro do Ministério Público poder abrir uma investigação em função de
suas próprias convicções, com reduzidas possibilidades de ser impedido por uma
autoridade superior. Ainda assim a presidenta Dilma Rousseff sancionou a lei. A
lei antiterrorismo também foi sancionada e possibilita a criminalização dos
movimentos sociais.
Em janeiro de 2014, a lei anticorrupção
entrou em vigor e em março o procurador-geral da República da época, Rodrigo
Janot, chancelou a criação da "força-tarefa" da "lava
jato". A orquestração das prisões e o ritmo da atuação do Ministério Público
e do ex-juiz Sergio Moro transformaram a operação em uma novela
político-judicial, com acentuada e sem precedente espetacularização midiática.
No mesmo ano a procuradora estadunidense
Leslie Caldwell afirmou que "a luta contra a corrupção estrangeira não é
um serviço que nós prestamos à comunidade internacional, mas sim uma medida de
fiscalização necessária para proteger nossos próprios interesses em questões de
segurança nacional e o das nossas empresas, para que sejam competitivas
globalmente". Em 2015, os colaboracionistas procuradores brasileiros se
reuniram com agentes dos EUA e lhes passaram todas as informações que
precisavam. Em troca pediram cerca de R$ três bilhões arrecadados nos EUA
fossem repassados para uma fundação que criariam. Os EUA aceitaram.
Em 1953, em razão da criação da Petrobras,
os EUA patrocinaram brasileiros para infernizar a vida de Getúlio Vargas,
levando-o ao suicídio no ano seguinte. Desde 1823, o presidente estadunidense
declarara que nenhuma potência poderia se estabelecer no continente e fixou o
lema da Doutrina Monroe: “América para os americanos”. O Brasil não se tornará
um país soberano sob as asas dos EUA e enquanto perdurar a atuação dos
vendilhões da pátria.
Fonte: Publicado originariamente no jornal O DIA, em 05/04/2022. Link: https://odia.ig.com.br/opiniao/2022/05/6395533-joao-batista-damasceno-o-suicidio-de-vargas-e-a-deposicao-de-dilma-fundamentos-comuns.html
A ASCENSÃO DO FASCISMO
Há 100 anos o fascismo
iniciou sua escalada na Itália. No ano de 1920, na Itália, uma greve geral de
mais de dois milhões de trabalhadores demonstrava a situação caótica vivida no
país. No campo, os camponeses sulistas exigiam a realização de uma reforma
agrária. Nos centros industrializados as reivindicações dos trabalhadores
despertaram o temor dos setores médios da sociedade italiana, da burguesia e
dos conservadores em geral. No contexto dos conflitos sociais e econômicos um
grupo de milicianos, liderados por Benito Mussolini, desfilava pelas ruas em
motocicletas afrontando a civilidade e apregoando o uso da força como solução
dos problemas que se vivenciavam.
A força miliciana conhecida
como “camisas negras” ganhou bastante popularidade em meio às contendas
nacionais. Os fascistas não se apresentavam como um problema nacional, mas como
solução. Em outubro de 1922, os fascistas realizaram a Marcha sobre Roma. A manifestação,
que tomou as ruas da capital italiana, exigia que o rei Vitor Emanuel III
passasse o poder para as mãos do Partido Nacional Fascista. Embora fossem
minoria, os fascistas exigiam a direção do governo, sob pena de tumultuarem a
vida institucional do país. Empresários e latifundiários queriam lucro e
sossego e por isso concordaram em autorizar o rei a entregar o governo a
Mussolini.
Entre 1922 e 1924, Benito
Mussolini governou de forma conciliatória, não se sobrepondo ao poder do rei
Vítor Emanuel III, o que não agradou a muitos dos membros do Partido Nacional
Fascista, que queriam a instalação de uma ditadura. No governo Mussolini havia
os ministros oficiais, mas a gestão de fato era exercida por gabinete paralelo.
Em janeiro de 1923, as milícias fascistas foram transformadas na Milícia
Voluntária de Segurança Nacional. Armas e motocicletas eram os equipamentos da
milícia fascista em suas atuações extravagantes.
Em 1924 ocorreram eleições
parlamentares na Itália e em meio a espancamentos e fraudes, os fascistas
conseguiram dois terços das cadeiras do Parlamento. Numa das primeiras sessões
do novo Congresso, em maio de 1924, o deputado socialista Giacomo Matteotti fez
um discurso apresentando provas das inúmeras irregularidades durante as
eleições, exigindo sua anulação. Os negacionistas retrucavam dizendo que era
esperneio de perdedor. Poucos dias depois, Matteotti foi sequestrado e somente em
agosto seu cadáver foi encontrado.
Diversos grupos antifascistas
lançaram manifestos culpando Mussolini e os milicianos a ele ligados pelo
assassinato do deputado Matteotti, o que só fez aumentar a violência das
milícias fascistas, que aproveitavam da situação para pressionar o governo a
acelerar a implantação da ditadura. A fragilidade das instituições não
conseguiu responder quem mandou matar Matteotti. Mas os indícios apontavam que
os criminosos estavam na esfera pessoal do ditador e que o assassinato era uma
questão de natureza estritamente política.
Em meio à repercussão
internacional, um dos milicianos suspeitos da morte do deputado Matteotti foi
executado, levando a conjeturas sobre possível queima de arquivo e dificultando
apurações. Mussolini abriu caminho para o regime fascista na Itália com o
perdão a criminosos que atentaram contra as instituições e a outros que
assassinaram opositores do regime. Em janeiro de 1925, Mussolini discursou
diante da Câmara dos Deputados, assumindo a responsabilidade por todos os
acontecimentos passados, desafiando as instituições e seus adversários. Entre
1925 e 1926, com o apoio do rei, dos industriais, do Exército e da Marinha,
Mussolini promoveu uma ampla perseguição política, impondo o Partido Nacional
Fascista como partido único, e iniciando a ditadura fascista, em que ele era o
Duce (o guia) da nova fase política italiana.
Desde que assumira o poder em
1922, Mussolini já tomava ações no sentido de minar as instituições
representativas. O poder legislativo foi completamente enfraquecido por
subornos ou ameaças. As instituições do sistema de Justiça eram afrontadas e
desprestigiadas. No ano de 1926, um suposto atentado sofrido por Mussolini foi
a brecha utilizada para a fortificação do Estado fascista.
Instalada a ditadura, após
quatro anos da chegada ao poder, os fascistas fecharam os órgãos de imprensa.
Os partidos políticos, exceto o fascista, foram colocados na ilegalidade, os
“camisas negras” incorporaram-se às forças de repressão oficial e a pena de
morte foi legalizada. O Estado fascista, contando com tantos poderes, aniquilou
grande parte das vias de oposição política. Entre os anos de 1927 e 1934,
milhares de civis foram mortos, presos ou deportados.
O apelo aos jovens, à família
e ao sentimento patriótico, rememorando a grandeza do Império Romano, instigou
grande apoio ao regime. Em 1929, os acordos firmados com a Igreja no Tratado de
Latrão aproximaram ainda mais a população religiosa italiana ao regime
totalitário. O fascismo perdurou na Itália até o fim da Segunda Guerra Mundial,
mas muitos dos seus princípios remanescem na atualidade, com tentativas
esporádicas de ressurgimento.
Já se disse que os fatos e
personagens na história do mundo ocorrem duas vezes: a primeira vez como
tragédia, a segunda como farsa. A história nos possibilita evitar os mesmos
erros dos nossos antepassados.
HOMENS HONRADOS
Hoje a partir das 11h, a
Universidade Livre do Leme promoverá mais uma aula do programa Filosofia na
Praia. Será no Quiosque Maria Alice, na Orla de Copacabana, quase em frente à
Rua Princesa Isabel. O professor Alexandre Leitão fará uma exposição intitulada
“Amigos, Romanos, Patrícios: Shakespeare, opinião pública e a peça ‘Júlio
César’”. Esta peça de Shakespeare é extraordinária. Após o atentado a Júlio
César, Marco Antônio foi para a escadaria do Senado e fez um discurso para a plebe,
revoltada com o assassinato.
Sem maldizer os assassinos,
Marco Antônio explicou as razões de cada um. O povo se quietou para ouvir quem
eram. E Marco Antônio depois de dizer cada nome e suas razões, concluía: “Mas,
fulano é um homem honrado”. E passava ao nome seguinte, explicitando as razões
e dizendo tratar-se de pessoa honrada. Assim, um por um, os assassinos foram
denunciados publicamente. Ao término do discurso o povo partiu furioso em busca
dos responsáveis pela morte do último governante da República Romana.
Júlio César governou num
período de crise. Antes dele, Roma se agitava em razão do empobrecimento da
população e da concentração das terras nas mãos da aristocracia. Dois irmãos
participavam desta agitação popular, Tibério Graco e Caio Graco. Eleitos
tribunos da plebe, representando os interesses dos pobres, foram assassinados.
Mas, antes de morrerem aprovaram leis importantes. Dentre tais leis estão a que
proibia o envio para a guerra de menores de 17 anos, a obrigação do Estado de
fornecer ‘um kit militar’ para os soldados convocados, a distribuição de trigo
a preço acessível para os pobres e a que mais contrariou os poderosos: a lei de
reforma agrária.
Assim como no Brasil, aqueles
que se apropriam de grandes quantidades de terras originariamente públicas não
aceitam a ideia de que outros igualmente possam tê-las. Tal como ocorre, no
Brasil, com os líderes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) ou
da Liga dos Camponeses Pobres (LCP), o destino dos dois irmãos reformadores foi
o assassinato. Mas dos seus sangues surgiu Júlio César que implementou algumas
reformas em benefício da população pobre, razão de sua morte.
O último recurso da política
é a força. Este é um conceito da Ciência Política. Mas a violência política
exercida pelo Estado é legítima quando socialmente autorizada e exercida de
acordo com o Direito. Daí a legitimidade das prisões em nosso sistema, depois
do trânsito em julgado. A violência política nas disputas pelo poder é
histórica. A publicação pela 'Folha de S. Paulo' da conversa da irmã do
ex-capitão Adriano da Nóbrega, na qual diz que houve nomeações para cargos
comissionados como prêmio por aquela morte, agitou as instituições brasileiras
nesta semana. O assassinato da vereadora Marielle Franco (Psol), no primeiro
mês da intervenção no Estado do Rio de Janeiro, com nomeação de um general para
interventor, depois alçado a ministro, tem permitido muitas cogitações, dentre
as quais razões políticas relativas à eleição presidencial de 2018.
Somente a apuração e a
publicidade dos interesses que levaram àquele atentado poderão aquietar as
especulações. Anteontem, dia 07, comemoramos o Dia do Jornalista e o
aniversário da fundação da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), que deverá
ter, a partir do próximo mês, a jornalista Cristina Serra em sua presidência,
primeira mulher a ocupar o cargo desde 1908. Este dia foi instituído como Dia
do Jornalista pela ABI, em 1931, centenário do golpe que destituiu D. Pedro I,
depois do assassinato do jornalista Líbero Badaró, crítico do Imperador. O
assassino se refugiou no Palácio do Ouvidor demonstrando o vínculo entre o
poder político e o crime. O Padre Feijó, membro do Conselho do Estado, foi um
dos responsáveis pela apuração do caso e punição dos culpados. Depois da abdicação
de D. Pedro I foi ministro da Justiça e Regente. Ainda ministro foi quem
recenseou as milícias e criou a Guarda Nacional.
Líbero Badaró, antes do
último suspiro, exclamou que morria defendendo a liberdade. Tal como Líbero
Badaró, jornalistas continuam sendo censurados, presos e assassinados no Brasil
numa brutal violação à liberdade de expressão garantida na Constituição da
República. A cada dia
mais precisamos defende-la, seja a crítica ácida de Líbero Badaró ou a denúncia
irônica de Marco Antônio. Quanto aos que podem ter responsabilidade no
assassinato da vereadora Marielle Franco, eu não ousaria fazer como Marco
Antônio e dizer ironicamente seus nomes, ainda que dissesse também serem homens
honrados.
Por hoje deixo de lado o
assunto da violência política em nossa sociedade e vou assistir à aula do
Professor Alexandre Leitão cantando a música da banda Engenheiros do Havaí,
‘Somos quem podemos ser’: “Quem ocupa o trono tem culpa. Quem oculta o crime também.
Quem duvida da vida tem culpa. Quem evita a dúvida também tem”.
Publicado originariamente no jornal O DIA, em 09/04/2022. Link: https://odia.ig.com.br/opiniao/2022/04/6376733-joao-batista-damasceno-homens-honrados.html