sábado, 26 de setembro de 2020

O POVO RESISTIRÁ, E VENCERÁ!


No filme “Arquitetura da Destruição” Peter Cohen diz que o objetivo do nazismo era embelezar o mundo e que por isto pretendia destruir tudo e todos que não estivessem em conformidade com os seus padrões estéticos e comportamentais. No Brasil, a Constituição instituiu um Estado Democrático de Direito que tem por um dos fundamentos o pluralismo. A diversidade é reconhecida como um direito e merece proteção estatal.

Os horrores do nazismo não atingiram somente os judeus. Os primeiros a serem eliminados foram os doentes crônicos, os idosos sem capacidade produtiva e dependentes do Estado ou da caridade pública e pessoas com debilidade mental. Também foram eliminados ciganos, comunistas e homossexuais. Hitler era um homem religioso, vegetariano e gostava de animais.

No Brasil florescem projetos inclusivos das elites de cada grupo social, mas excludentes da maioria da população. O golpe que foi promovido no Brasil, teve como base e escada as políticas anteriores que lhe criaram as condições de efetivação, e escancara o descompromisso com os princípios gerais estabelecidos na Constituição para as atividades econômicas, dentre o que, a valorização do trabalho humano, a existência digna, a soberania nacional, a função social da propriedade, a defesa do meio ambiente e a busca do pleno emprego.

O ideal do pleno emprego está sendo substituído pelo recrutamento seletivo em cada grupo social, a fim de acomodar as desigualdades estruturais, promovendo a exclusão da maioria da participação do resultado da riqueza socialmente produzida. Políticas corporativas a pretexto de ‘responsabilidade social’ se assemelham às criadas pelos autores da expressão, que reduziram a América Central a países produtores de banana, governados por ditadores escolhidos pelos executivos das empresas.

Responsabilidade social era a esmola que se dava, na América Central, a alguns vendilhões da pátria, enquanto se roubava o país inteiro. Neste cenário de exclusão do povo da participação na riqueza socialmente produzida e pretensão de imposição de padrões de comportamentos, tal como fez o nazismo, um Projeto de Lei em tramitação na Assembleia Legislativa de São Paulo chama a atenção. Um deputado deseja proibir a entrada no Metrô de pessoas “trajadas antissocialmente”, pois poderiam causar incômodo. Além dos "trajados antissocialmente", estariam impedidas de viajar as pessoas "embriagadas”, "enfermas de moléstias contagiosas, que causem repugnância, ou que exijam cuidados especiais”.

A proposta pretende ainda proibir quem se se servir dos trens para efetuar transporte de mercadoria. A proposta dá poderes exagerados aos agentes privados da segurança, que poderiam conduzir coercitivamente o passageiro à delegacia.

No Haiti, a Milícia de Voluntários da Segurança Nacional, força paramilitar inspirada no fascismo, composta por homens conhecidos como ‘Tonton Macoute’ que se traduz como ‘Tio do Saco’ em alusão às estórias do ‘homem do saco’ ou ‘bicho papão’, foi criada para ‘colocar ordem no país’ e obedecia diretamente ao ditador François Duvalier, o 'Papa Doc', e depois ao seu filho e sucessor, Jean-Claude Duvalier, o ‘Baby Doc’.  Foram responsáveis pelo desaparecimento de cerca de 150 mil pessoas de 1959 a 1986.

Esses projetos que têm suposto objetivo de ‘colocar ordem no país’ começam por pretender excluir a presença do povo dos bens públicos que a todos pertencem e acabarão por pretender expulsar o próprio povo do país ou eliminá-lo. Em parceria com os ‘terrivelmente religiosos’ não faltará quem proponha fogueiras como as da Santa Inquisição ou fornos de cremação para os indesejáveis. Mas, não passarão!

 

Publicado originariamente no jornal O DIA, em 26/09/2020. Link: https://odia.ig.com.br/opiniao/2020/09/5995474-joao-batista-damasceno--o-povo-resistira--e-vencera.html


sábado, 12 de setembro de 2020

O judiciário e a censura à imprensa



Até a chegada da Família Real ao Brasil, em 1808, eram proibidas as publicações de jornais, livros ou quaisquer meios de difusão do conhecimento. Os poucos textos escritos vinham da Metrópole, sob rígido controle. Até mesmo a impressão das bíblias católicas, destinadas aos padres, estavam sujeitas a autorização para impressão. Portanto, os primeiros 300 anos da nossa história foram de difusão da ignorância e da brutalidade.

Enquanto pelo restante da América eram instaladas as primeiras universidades fora da Europa, no Brasil somente em 1920 foi criada a Universidade do Brasil, atual UFRJ, que no último dia 07 fez 100 anos. A Universidade de São Domingos, de 1538, é historicamente a primeira universidade das Américas. A de San Marcos, no Peru, é de 1551, a México é de 1553, a de Bogotá é de 1662, a de Cuzco, também no Peru, é de 1692, a de Havana, em Cuba, é de 1728 e a de Santiago, no Chile, é de 1738. As primeiras universidades norte-americanas, Harvard, Yale e Filadélfia, surgiram respectivamente em 1636, 1701 e 1755. As universidades no Brasil são tão jovens quanto os negros e pobres que a brutalidade do capital e do Estado executa na periferia e, igualmente, querem asfixiá-las.

Assim como era proibida a produção e difusão do conhecimento no Brasil Colônia não se permitia, também, a liberdade de expressão. O dia 10 de setembro de 1808 marca o início oficial da imprensa no Brasil com a fundação da Gazeta do Rio de Janeiro. Era um veículo de interlocução entre os leitores do Reino e da América Portuguesa. Mas, clandestinamente, desde 01 de junho de 1808 já circulava o Correio Braziliense ou Armazém Literário, editado por Hipólito da Costa. Impresso em Londres, o Correio Braziliense difundia ideias liberais como a de uma monarquia constitucional e o fim da escravidão e deu ampla cobertura à Revolução Pernambucana de 1817 e aos acontecimentos de 1821 e de 1822 que conduziriam à Independência do Brasil.

A história da liberdade de expressão no Brasil sempre foi um caso de polícia. Cansado de apanhar da polícia, Apparício Torelly, o Barão de Itararé, escreveu na porta de seu jornal a frase destinada a ela: “Entre sem bater”. Quando algum poderoso não gostava de uma matéria mandava a policia prender o jornalista, recolher a edição e apreender os tipos, que eram as letras de chumbo com diferentes tamanhos e grafias com as quais se imprimiam os jornais. A polícia misturava todas as letras e as embrulhava formando um grande pastel. Ao devolvê-las estava destruído o instrumento de trabalho para impressão do jornal, pois era impossível separá-las. Alberto Dines dizia que “era o linchamento aplicado a um meio de imprensa”.

A constituição de 1988 vedou toda forma de censura prévia e extinguiu os órgãos policiais destinados a tal fim. Dispõe a Constituição que é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença. A Constituição assegura a livre manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo.

Nenhuma lei pode conter dispositivo capaz de constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística. A Constituição assegura a inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas e garante o direito a indenização por dano material ou moral decorrente de sua violação. Além, claro, do direito de resposta, proporcional ao agravo. Portanto, ao dispor sobre garantias individuais, a Constituição não autoriza censura prévia. Ao contrário, expressamente, veda toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística.

Se a Constituição extinguiu os órgãos de censura e vedou que lei contenha dispositivo que possa embaraçar a plena liberdade de informação jornalística, não pode o poder judiciário exercer o papel de censor prévio, sob pena de usurpação de poder que não lhe foi conferido pelo poder constituinte.

 

Publicado originariamente no jornal O DIA, em 12/09/2020. Link: https://odia.ig.com.br/opiniao/2020/09/5987393-joao-batista-damasceno--o-judiciario-e-a-censura-a-imprensa.html

 


quarta-feira, 2 de setembro de 2020

Os Gladiadores do Altar da Igreja Universal: soldadinhos evangelizados para a “luta contra o mal”.

A neopentecostal "Igreja Universal", que desempenhou papel central no triunfo dos grupos contra direitos humanos no Brasil, vem, há anos, formando homens que pretendem "fazer a obra de Deus e desfazer as obras do mal".

Um vídeo difundido nas redes sociais mostra imagens da formação do exército dos "Gladiadores do Altar", um bando militar de homens imbuídos de certo misticismo guerreiro.

A formação dessas "milícias" e a difusão dessas imagens faz parte da agenda política desta agremiação “religiosa”.

No vídeo postado nas redes sociais uma locutora diz que os “Gladiadores do Altar” são homens que "renunciarão a muitas coisas para serem preparados por Deus. Nós formaremos uma nova geração de pastores guerreiros, determinados a fazer a obra de Deus e desfazer as obras do mal. Eles farão o inferno tremer. Gladiadores, aqueles cuja força está em seu espírito ... "

Atenção Gladiadores! - Bispos dizem em plena cerimônia

Altar, altar, altar! - respondem em tom uníssono dezenas de homens vestidos em calças de gabardina, camisas de algodão estampada com escudos "exército" e mocassins que, marchando em passo militar, geram um barulho estrondoso no templo.

Vocês são jovens que atenderam ao chamado do nosso supremo General, o Senhor Jesus Cristo. Jovens que dizem "se Deus me usa para o seu trabalho", quero levar a palavra do meu Deus - os bispos discutem.

Dispõe a Constituição em seu art. 17, § 4º que “É vedada a utilização pelos partidos políticos de organização paramilitar”.

Se a democracia quiser sobreviver no Brasil terá que pensar na laicidade do Estado, na vedação de manifestações religiosas em órgãos públicos ou em entidades delegatárias de serviços públicos (inclusive canais delegados de rádio e TV), utilização de templos religiosos para atividade político-partidária e vedação de formação de milícias de todo tipo não só por partidos políticos, mas por qualquer pessoa física, jurídica ou organização. E que sejam proibidas organizações uniformizadamente paramilitares ou que a elas se assemelhem, tal como os "Gladiadores do Altar" e outras entidades que se têm formado pelo país.