Concessionária
responde por danos a terceiros antes da concessão - Princípio da sucessão
“Ao julgador compete apreciar os fatos narrados e
qualificá-los de acordo com a ordem jurídica, pouco importando se de tal
enquadramento legal resultará vantagem ou prejuízo a quem quer que seja
[...] Não se pode ter a consideração a priori dos fatos a pretexto
de evitar fuga de investimentos. Tal fato implicaria uma interpretação jurídica
a priori favorável à empresa e aos investidores em prejuízo dos
passageiros e da sociedade”.
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de março de 2016, 9h44
Concessionária
de serviço público também pode responder por danos a terceiros
ocorridos antes do início da concessão. Foi a tese que a 27ª Câmara Cível do
Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro consolidou ao negar um recurso da
Supervia, que opera os trens do estado, contra sentença que a
condenou a pagar indenização à família de um usuário que morreu ao cair de uma
composição que trafegava com as portas abertas. O acidente aconteceu em 1989,
quando o sistema ainda era administrado pela Companhia Fluminense de Trens
Urbanos (Flumitrens).
João
Batista Damasceno, desembargador substituto que relatou o recurso, explicou que
a responsabilização, nesse caso, se deve ao princípio da sucessão. No voto, ele
esclareceu que a Flumitrens funcionou até 2001, quando foi parcialmente
cindida. Com a operação, foi criada a Companhia Estadual de Engenharia de
Transportes e Logística, que assumiu algumas linhas, às quais
administra até hoje. Porém, as linhas sob a responsabilidade da Flumitrens
passaram a ser exploradas pela Supervia, por meio do contrato de concessão,
assinado após a empresa vencer o processo de licitação.
Segundo
Damasceno, a Supervia incorporou o patrimônio da Flumitrens com a concessão,
utilizando-o para prestar o serviço de transporte. E, pela Lei das Sociedades
por Ações, a empresa que absorve parte do patrimônio da empresa cindida deve
sucedê-la nos direitos e obrigações relativos ao ato de cisão.
De
acordo com o relator, esse entendimento não contraria o posicionamento do
Superior Tribunal de Justiça, firmado em 2011 no julgamento de um recurso
repetitivo, que negou a existência de relação sucessória entre a Supervia
e a Flumitrens. Na ocasião, os ministros entenderam que, por ter
assumido a concessão do serviço público mediante contrato administrativo
precedido de licitação, “descabe imputar à Supervia o cumprimento de obrigações
da Flumitrens, como as decorrentes de ato ilícito ocorrido durante a concessão
anterior”.
Damasceno
destacou que os casos são diferentes, pois o recurso em análise no
TJ-RJ não trata da responsabilidade por ato ilícito da sucedida, mas da
responsabilidade objetiva — ou seja, decorrente do dano inerente
à atividade desenvolvida. “No caso presente, o que se tem é a necessidade
de aferição de situação fática quanto à continuidade de atividade já
desempenhada,
com utilização da azienda [patrimônio] da empresa sucedida, ou desempenho de
atividade originariamente por delegação contratual após processo licitatório”,
afirmou.
Ao
analisar o recurso, o relator constatou que o contrato de concessão
reconhece a condição da sucessora da recorrente, mas tenta afastar a
responsabilização dela perante terceiros por eventuais danos causados
pela Flumitrens. Ele explicou que a tese de inexistência de sucessão jurídica
foi construída a partir de um conjunto de debates promovidos pela
Supervia. Nos eventos, que contaram com participação de juristas, a
questão acabou sendo analisada mais do ponto de vista das consequências
econômicas das condenações.
Por
entender que, no Estado Democrático de Direito, não se pode admitir decisões em
desconsideração à ordem jurídica para atender à ordem econômica, Damasceno
votou pela manutenção da sentença, que condenou a recorrente a pagar uma
indenização R$ 110 mil por danos morais à família do usuário morto. A decisão
foi unânime.
“Ao
julgador compete apreciar os fatos narrados e qualificá-los de acordo com a
ordem jurídica, pouco importando se de tal enquadramento legal resultará
vantagem ou prejuízo a quem quer que seja [...] Não se pode ter a
consideração a priori dos fatos a pretexto de evitar fuga de
investimentos. Tal fato implicaria uma interpretação jurídica a priori
favorável à empresa e aos investidores em prejuízo dos passageiros e da
sociedade”, concluiu.
Fonte: http://www.conjur.com.br/2016-mar-03/rj-concessionaria-responde-danos-terceiros-antes-concessao
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