Até a chegada da Família Real ao Brasil, em 1808, eram proibidas as publicações de jornais, livros ou quaisquer meios de difusão
do conhecimento. Os poucos textos escritos vinham da Metrópole, sob rígido
controle. Até mesmo a impressão das bíblias católicas, destinadas aos padres,
estavam sujeitas a autorização para impressão. Portanto, os primeiros 300 anos
da nossa história foram de difusão da ignorância e da brutalidade.
Enquanto pelo restante da
América eram instaladas as primeiras universidades fora da Europa, no Brasil
somente em 1920 foi criada a Universidade do Brasil, atual UFRJ, que no último
dia 07 fez 100 anos. A Universidade de São Domingos, de 1538, é historicamente
a primeira universidade das Américas. A de San Marcos, no Peru, é de 1551, a
México é de 1553, a de Bogotá é de 1662, a de Cuzco, também no Peru, é de 1692,
a de Havana, em Cuba, é de 1728 e a de Santiago, no Chile, é de 1738. As
primeiras universidades norte-americanas, Harvard, Yale e Filadélfia, surgiram
respectivamente em 1636, 1701 e 1755. As universidades no Brasil são tão jovens
quanto os negros e pobres que a brutalidade do capital e do Estado executa na
periferia e, igualmente, querem asfixiá-las.
Assim como era proibida a
produção e difusão do conhecimento no Brasil Colônia não se permitia, também, a
liberdade de expressão. O dia 10 de setembro de 1808 marca o início oficial da
imprensa no Brasil com a fundação da Gazeta do Rio de Janeiro. Era um veículo
de interlocução entre os leitores do Reino e da América Portuguesa. Mas,
clandestinamente, desde 01 de junho de 1808 já circulava o Correio Braziliense
ou Armazém Literário, editado por Hipólito da Costa. Impresso em Londres, o Correio Braziliense difundia ideias liberais como a de uma monarquia
constitucional e o fim da escravidão e deu ampla cobertura à Revolução
Pernambucana de 1817 e aos acontecimentos de 1821 e de 1822 que conduziriam à
Independência do Brasil.
A história da liberdade
de expressão no Brasil sempre foi um caso de polícia. Cansado de apanhar da
polícia, Apparício Torelly, o Barão de Itararé, escreveu na porta de seu jornal
a frase destinada a ela: “Entre sem bater”. Quando algum poderoso não gostava
de uma matéria mandava a policia prender o jornalista, recolher a edição e
apreender os tipos, que eram as letras de chumbo com diferentes tamanhos e
grafias com as quais se imprimiam os jornais. A polícia misturava todas as
letras e as embrulhava formando um grande pastel. Ao devolvê-las estava
destruído o instrumento de trabalho para impressão do jornal, pois era
impossível separá-las. Alberto Dines dizia que “era o linchamento aplicado a um
meio de imprensa”.
A constituição de 1988
vedou toda forma de censura prévia e extinguiu os órgãos policiais destinados a
tal fim. Dispõe a Constituição que é livre a expressão da atividade
intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de
censura ou licença. A Constituição assegura a livre manifestação do pensamento,
a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo.
Nenhuma lei pode conter
dispositivo capaz de constituir embaraço à plena liberdade de informação
jornalística. A Constituição assegura a inviolabilidade da intimidade, da vida privada,
da honra e da imagem das pessoas e garante o direito a indenização por dano
material ou moral decorrente de sua violação. Além, claro, do direito de
resposta, proporcional ao agravo. Portanto, ao dispor sobre garantias
individuais, a Constituição não autoriza censura prévia. Ao contrário,
expressamente, veda toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e
artística.
Se a Constituição
extinguiu os órgãos de censura e vedou que lei contenha dispositivo que possa
embaraçar a plena liberdade de informação jornalística, não pode o poder
judiciário exercer o papel de censor prévio, sob pena de usurpação de poder que
não lhe foi conferido pelo poder constituinte.
Publicado originariamente no jornal O DIA, em 12/09/2020.
Link: https://odia.ig.com.br/opiniao/2020/09/5987393-joao-batista-damasceno--o-judiciario-e-a-censura-a-imprensa.html
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