Visando a qualificar os funcionários públicos o presidente Getúlio
Vargas instituiu o Departamento de Administração do Serviço Público (Dasp),
encarregado de formar a elite dirigente dos órgãos estatais e prestação de
adequados serviços públicos à sociedade brasileira. Era um projeto de nação
soberana em prol dos brasileiros e não um projeto ‘patrioteiro’ como o dos que
vestem camiseta verde-amarela, mas choram e batem continência diante de
bandeira de país estrangeiro para entregar as riquezas nacionais.
Uma importante geração de brasileiros foi qualificada profissionalmente
no Governo Vargas. O avô do deputado Rodrigo Maia e pai do vereador e
ex-prefeito César Maia, Felinto Epitácio Maia, foi dirigente da
Superintendência da Moeda e do Crédito (Sumoc), desdobrada posteriormente em
Banco Central e Casa da Moeda. Fez parte da geração de profissionais
valorizados e qualificados para o serviço ao público na Era Vargas.
A relação familiar dos Maias com a burocracia estatal vem das origens
no Nordeste e com o mercado financeiro perpassa gerações. Mas, o deputado
Rodrigo Maia também é genro do ex-governador Moreira Franco, que era genro do
ex-governador Amaral Peixoto que era genro de Getúlio Vargas. A parentela é
conceito sociológico estudado no Brasil por Oliveira Vianna, talvez o mais
importante intérprete do Brasil e intelectual orgânico do Governo Vargas.
Desde a formação do Brasil, os genros foram de muita importância
política. Era mediante o casamento das filhas com os bacharéis oriundos das
cidades que os coronéis estabeleciam relações com o governo central e a
burocracia estatal. A Primeira República ficou notável pelo coronelismo,
caracterizado pelo mandonismo local dos donos de terras, e o bacharelismo dos
genros
A desorganização dos serviços públicos na Primeira República foi quase
total e isto atendia aos interesses dos coronéis. A Era Vargas reinventou o
Brasil, mas os projetos de desorganização dos serviços públicos em prol dos
interesses privados foram retomados, em prejuízo da sociedade brasileira.
Grandes obras públicas do passado foram programadas e executadas por
órgãos públicos e seus funcionários. As mais notáveis são as projetadas pelo
funcionário público Oscar Niemeyer, em seus anos iniciais de carreira. Desde a
Era JK as empreiteiras ganharam terreno e os funcionários que antes exerciam o
papel foram sendo deixados de lado. E assim fizeram sucessivos governos nas
diversas esferas federativas. No Rio de Janeiro, no Governo Leonel Brizola, foi
diferente. Para construção dos Cieps foi montada uma ‘fábrica de escolas’, e
dela saiu também o sambódromo
Neste momento, além da desvalorização dos servidores públicos, tem-se
igualmente o desmonte do serviço público. A um só tempo atende-se a três
interesses: os serviços públicos passarão a ser prestados por empresas
privadas, que além de cobrar pelos serviços, serão subsidiadas pelo poder
público, sem qualquer controle; os serviços a serem prestados à administração
pública serão contratados no mercado, enriquecendo quem os presta e, os
servidores públicos concursados e efetivos serão substituídos por ocupantes de
cargos comissionados. Estes são imprescindíveis para as ‘rachadinhas’, pois
funcionários concursados e efetivos não contribuem para os que os nomeiam e os
mantém no cargo.
O desmonte do serviço público não é um acidente. É um projeto e atende,
também, aos interesses do capital financeiro. O problema é que muita gente que
está, com razão, desgostosa com os serviços prestados precariamente, não pugna
pela sua melhoria, mas pela sua privatização. Mas, muitos não poderão pagar por
eles quando forem prestados e cobrados pelo mercado. A PEC da Reforma Administrativa
é o fim de um projeto de responsabilidade do Estado com a sociedade brasileira.
É o fim do pouco que temos de Estado de Bem Estar Social.
Publicado originariamente no
jornal O DIA, em 07/11/2020. Disponível no link: https://odia.ig.com.br/opiniao/2020/11/6023080-joao-batista-damasceno-desmonte-do-servico-publico-e-do-brasil.html
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